Título: No Uruguai, Câmara descriminaliza aborto até a 12º semana de gravidez
Autor: Guimarães, Marina
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/09/2012, Vida, p. A28

Por 50 votos a 49, a Câmara do Uruguai aprovou, no fim da noite de anteontem, um proje­to de lei que descriminaliza o aborto até a 12º semana de ges­tação. Em caso de estupro, o aborto poderá ser feito até a 14º; em caso de risco para a mãe, não haverá prazo limite. Para fazer o procedimento, a mulher terá de explicar sua de­cisão para um tribunal.

O texto muda a proposta que havia sido aprovada pelo Senado em dezembro. Por isso, o proje­to volta ao Senado, onde não de­ve ter problemas para sua aprova­ção final, já que o partido governista da Frente Ampla tem maio­ria absoluta. Se o projeto for rati­ficado, o Uruguai será o primeiro país da América do Sul a descriminalizar o aborto.

A proposta do partido do go­verno foi rejeitada duas vezes. A última delas, a denominada Lei de Saúde Sexual e Reprodutiva, foi vetada pelo então presidente Tabaré Vázquez, em 2008, que ci­tou a justificativa "razoes filosóficas e biológicas", provocando uma crise partidária. O presiden­te José "Pepe" Mujica já anun­ciou que não vetará o projeto.

A Frente Ampla teve o apoio de um dos deputados do Partido Independiente (PI, de centro), Iván Posada, que compensou a perda do voto de um deputado governista, Andrés Lima, autori­zado pelo partido a votar contra a matéria. Tanto a Frente Ampla quanto o Partido Colorado (de centro-direita) decidiram apli­car a disciplina partidária para o tratamento da matéria.

A medida fez com que vários deputados declarassem, anteci­padamente, a decisão de se retirar do plenário na hora da vota­ção, para serem substituídos por suplentes.

Para seus defensores, a lei dará à mulher "as maiores garan­tias" para realizar o aborto, co-mo afirmou Posada. Já os contrários, como o Partido Nacional, evocaram o "direito à vida" e "a defesa dos direitos humanos". O texto estabelece que toda mulher "terá direito a decidir sobre a interrupção voluntária de sua gravidez durante as primeiras 12 semanas da gestação".

De acordo com o deputado governista Juan Carlos Souza, o projeto "não legaliza o aborto, mas abre uma instância importante para que as mulheres decidam livremente se vão abortar, com adequado apoio médico e egal, sem que sejam consideradas criminosas".

Tribunal. Para a líder do ONG Mulher e Saúde no Uruguai, Mar­ta Aguñin, o projeto não descriminaliza totalmente a interrup­ção voluntária da gravidez por­que obriga a mulher a se apresen­tar a um tribunal integrado por médicos e assistentes sociais pa­ra explicar sua decisão.

Aguñin diz que o tribunal "é moralizante" e determina que a mulher pense por cinco dias. Ela afirma que ninguém garante que o sistema de saúde público ou privado estejam em condições de oferecer os serviços no perío­do determinado pela lei. Se o pro­cesso demorar mais que o prazo estipulado, o aborto continuará sendo um delito e a mulher corre o risco de ser punida.

Pesquisa divulgada na semana passada mostrou que 52% dos uruguaios apoiam a iniciativa; 34% são contrários.