Título: Brasil foi último almoço grátis, diz Dilma
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/10/2012, Economia, p. B9

Em entrevista ao jornal britânico "Financial Times", presidente dá recado aos bancos e diz querer o Brasil como país de classe média

A presidente Dilma Rousseff disse em entrevista ao "Financial Times", publicada ontem, que o Brasil "foi o último almoço grátis do mundo para os bancos", mas deixou de sê-lo após a queda na taxa básica de juros, atualmente em 7,5% ao ano. Ela se referiu a uma frase muito citada por economistas, de que "não existe almoço grátis". A sentença é associada ao Prêmio Nobel de Economia Milton Friedman, embora ele mesmo tenha negado que a criou.

Em resposta a uma pergunta sobre se os temores de que a intervenção verbal do governo possa interferir no setor bancário, embora os bancos sejam criticados por cobrarem taxas de juros exorbitantes no Brasil, Dilma afirmou que o País é o último no mundo onde as instituições financeiras ainda podem cobrar taxas tão altas.

Na entrevista ao FT, a presidente destacou que um dos ganhos importantes que o Brasil teve em quase dez anos de governo do Partido dos Trabalhadores (PT) foi conquistar uma população de classe média. "Nós queremos um Brasil de classe média", declarou ela.

O jornal afirma que um progresso notável foi feito para melhorar a sorte de milhões de pessoas em um país que continua a ser uma das sociedades mais desiguais do mundo. A publicação diz, porém, que após quase uma década de condições globais amplamente favoráveis a economia brasileira parou de repente.

Questionada sobre seus principais desafios, Dilma respondeu que o relaxamento da política monetária dos EUA, quando não acompanhado de políticas fiscais para absorver o empoçamento de liquidez, leva à desvalorização cambial e inflação. "As políticas monetárias expansionistas que resultam em uma desvalorização da moeda são as políticas que criam assimetrias nas relações comerciais - assimetrias graves", disse ela.

Mas a presidente reconhece que muitos dos problemas do Brasil são também locais. Os elevados custos do trabalho, a baixa produtividade, infraestrutura precária e alta tributação - com gastos do governo em 36% do Produto Interno Bruto (PIB), valor equivalente ao de muitos países europeus avançados, mas sem os mesmos níveis de eficiência - criaram uma situação em que a inflação surge sempre que a economia começa a crescer.

O jornal afirma que, embora não prometa um grande pacote de reformas, como visto recentemente na Índia, que desregulamentou os setores de varejo e de companhias aéreas, Dilma disse que o Brasil está reduzindo o custo do trabalho por meio da desoneração da folha de pagamentos das empresas.

Até agora, 40 setores industriais foram beneficiados e outras medidas fiscais estão por vir, declarou a presidente na entrevista. "Isso é importante porque não queremos punir aqueles que empregam as pessoas."

"Nós estamos voltando para um lugar com níveis normais de rentabilidade. Isso significa que alguns de nós precisam começar a olhar para os lucros adequados em atividades produtivas que são boas para o país", disse a presidente.

Dilma não quis comentar o processo do mensalão, que está sendo julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e marcou o primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Fernando Montenegro, a atriz preferida da presidente, disse ao Financial Times que "nós ganhamos com Dilma porque ela não se encaixa na forma tradicional de fazer política no Brasil".