Título: Uma derrota do bolivariano mudará a região
Autor: Berger, Ryan
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/10/2012, Internacional, p. A20

Futuro da Alba e da aliança com Cuba seria colocado em xeque com vitória da oposição no domingo

O resultado das eleições na Venezuela não determinará apenas a trajetória do país nos próximos seis anos. Terá também grandes implicações para a América Latina. Amanhã, o “Socialismo do século 21” do presidente Hugo Chávez enfrentará a visão do opositor Henrique Capriles, inspirada no modelo do Brasil, que tem como objetivo uma economia com base no mercado e uma forte política de bem-estar social. Enquanto Capriles promete abrandar a ingerência do Estado na economia Chávez prometeu dobrar seu projeto econômico, afirmando que lançará o “segundo ciclo socialista,de 2013 a 2019, com muito mais força”. Chávez tem muito dinheiro para distribuir: a Venezuela localiza-se sobre as maiores reservas de petróleo do mundo, segundo a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). O recurso representa 95% das exportações do país. Não só a estatal Petróleos de Venezuela (PDV-SA) contribuiu com US$ 61,4 bilhões para programas de desenvolvimento social interno, entre 2004 e 2010,como Chávez trata a companhia como um banco particular para executar seus objetivos em política externa.

Ele vende petróleo a preços mais baixos para a aliança Petro-Caribe de 18 nações do Caribe e América Central, que ajudou a fundar em 2005.Diariamente,fornece cem mil barris de petróleo somente a Cuba. Em 2011, Chávez fez um acordo com a China de troca de petróleo por empréstimos,que aumentou consideravelmente a dívida da Venezuela com a República Popular. Em dezembrode 2011, esse número chegou a US$28 bilhões. Tudo isso se deu à custa de uma frágil situação interna em que predominam a pobreza, a escassez de alimentos e a criminalidade.

Capriles disse em seu discurso de encerramento que Chávez “deu a outros países recursos que pertencem a vocês e acendeu luzes no exterior enquanto aqui estamos às escuras”, um sinal de que quer encerrar o envolvimento da Venezuela na PetroCaribe. Do mesmo modo, se Chávez perder, será questionado também o futuro da Aliança Bolivariana para as Américas (Alba). Edmundo González,um assessor da oposição, supõe que um governo de Capriles “recuperará uma política externa que sirva aos interesses do nosso país ”e não continuará o status quo.

Consequentemente, a Alba, estabelecida em 2004, e em grande parte financiada por Chávez desde então,precisaria de um excêntrico líder de esquerda paracontinuar a dirigi-la. Uma hipótese possível é que o presidente do Equador, Rafael Correa, poderia preencher o vácuo. Entretanto, embora o Equador seja o único outro país membro da Opep na América do Sul, Correa não dispõe das maciças reservas de petróleo concedidas à Venezuela.Além disso, como poderia um movimento bolivariano continuar prosperando sem a participação daVenezuela? Na realidade,a derrota de Chávez assinalaria um enorme golpe para a Alba, que já é enfraquecida pela União das Nações Sul-Americanas (Unasul), criada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silvae muito mais influente. Se Capriles ganhar, as relações com a Colômbia serão beneficiadas. Enquanto Chávez mantém relações satisfatórias com Juan Manuel Santos, o relacionamento com o seu antecessor, Álvaro Uribe,foram instáveis e turbulentas. Uma amizade estável entre Venezuela e Colômbia é a coisa mais importante neste momento,uma vez que no dia 15 de outubro a Colômbia começará as negociações com asFarc –nas quais a Venezuela terá o papel de observadora. Onde é que o Brasil se encaixa nesta equação? Embora Capriles tenha citado Lula como seu modelo de político, a verdade é que Embraer, Odebrecht e Petrobrás aproveitaram consideravelmente o mandato de Chávez.

Acreditamos que isso continuará se Chávez perder; Capriles precisará formar um forte pacto com Brasília para garantir robustos vínculos com as multinacionais brasileiras e sua competência,particularmente considerando a recente admissão da Venezuela no Mercosul.