Título: Disputa afeta Ciência sem Fronteiras
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/09/2012, Vida, p. A29

Vitrine de Dilma Rousseff no exterior, o programa Ciência sem Fronteiras está no meio de uma disputa envolvendo a presidente, um general reformado americano - um herói da Guerra do Kuwait - e um príncipe da Arábia Saudita. Ambos questionam o uso do nome Science without Borders pelo governo brasileiro na divulgação do programa de intercâmbio de estudantes no exterior.

Assim que soube do caso, a presidente Dilma ordenou que assessores encontrassem uma saída para o embaraço, fosse jurídica ou diplomática. O Palácio do Planalto avisou que não quer abrir mão do nome, amplamente divulgado no exterior.

O alerta chegou aos Ministérios da Educação e Ciência e Tecnologia há cerca de um mês. Um ofício, assinado por representantes de uma fundação chamada Living Oceans, pedia que o Brasil não usasse mais o termo Science without Borders.

Segundo o documento, esse nome já teria sido registrado pela organização sem fins lucrativos em 2001 nos Estados Unidos e em 2007 na União Européia. No site dessa fundação, o nome do programa vem acompanhado do símbolo de marca registrada.

Com sede em Landover, no Estado de Maryland, na Costa Leste dos Estados Unidos, a Living Oceans é dirigida pelo general reformado Charles A. Horner, que comandou operações áreas na Arábia Saudita e lutou na Guerra do Kuwait. É também financiada pelo príncipe Khaled bin Súltan, ministro e inspetor-geral para assuntos militares na Arábia Saudita.

No ofício, representantes da fundação alegam que o Science Without Borders é o principal projeto da Living Oceans e que o uso do nome pelo governo brasileiro poderia gerar desentendimentos com parceiros e pesquisadores. Em seu site, a fundação afirma que o programa patroci­na atividades de conservação ma­rinha e pesquisas científicas, além de promover ações para preservação dos oceanos.

O caso está sendo tocado com reserva pelo Ministério das Rela­ções Exteriores e pela Advocacia-Geral da União (AGU).

Preocupação. Universidades americanas e outros parceiros in­ternacionais do Brasil no progra­ma já teriam demonstrado preo­cupação com o imbróglio e o go­verno teme que o caso atrapalhe a divulgação do Ciência sem Fronteiras internacionalmente.

A ordem é evitar o uso do nome em inglês e a reprodução de pe­ças publicitárias ou material in­formativo enquanto a questão não for solucionada.

Integrantes do governo sus­tentam que as negociações ain­da não chegaram aos tribunais, mas também não descartam a possibilidade de isso acontecer. A AGU já está estudando instru­mentos jurídicos para o caso de disputa, analisando a legislação nacional e internacional sobre patentes.

Tentativas. Dentro do gover­no, foram várias as tentativas de encontrar uma solução para esse problema. Uma lista com suges­tões de novos nomes para o pro­grama foi apresentada ao Planal­to, como Science without Frontiers. Não agradou. Outra alter­nativa seria incluir a expressão "a brazilian program". Porém, os militares estrangeiros não te­riam aprovado a proposta.

O assunto também foi levado para a última reunião do comitê executivo do programa Ciência sem Fronteiras, coordenado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Coordena­ção de Aperfeiçoamento de Pes­soal de Nível Superior (Capes), que conta com a participação de membros da Casa Civil.

O CNPq sugeriu a possibilida­de de um acordo com a fundação para o desenvolvimento de pes­quisas na área de ciências do mar em troca do uso do nome no exte­rior. "O importante é encontrar uma solução rápida e pacífica. Acredito que seria mais difícil se fosse uma empresa, mas esta­mos conversando com uma insti­tuição que não tem fins lucrati­vos e o objetivo deles também é a educação, como a gente", disse o presidente do CNPq, Glaucius Oliva. "Foi uma surpresa. Não é tradição no Brasil registrar no­mes de programas de governo e também o nome é Ciência sem Fronteiras. O inglês é só uma tra­dução feita por nossos parcei­ros", explicou.

O Estado não conseguiu con­tato com os representantes da fundação Living Oceans.

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