Título: Projetos com células de embriões são minoria
Autor: Escobar, Herton
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/10/2012, Vida, p. A14

Apenas dois entre os cerca de 2 mil estudos clínicos em andamento com células-tronco no mundo utilizam células-tronco embrionárias humanas - o tipo mais difícil de se trabalhar, tanto do ponto de vista biológico, por conta da sua enorme capacidade de diferenciação, quanto do ponto de vista ético e regulatório, por causa das polêmicas envolvendo o uso de embriões humanos para pesquisa.

Todos os outros são baseados em células-tronco "adultas", retiradas de tecidos não embrionários, como da medula óssea ou de tecido adiposo (gordura). Um prato cheio para os críticos das células embrionárias.

Para a maioria dos especialistas na área, porém, elas continuam a ser uma ferramenta indispensável de pesquisa, seja para uso direto em terapia ou como modelo para compreensão dos mecanismos básicos de desenvolvimento embrionário e diferenciação celular. Muitos estudos pré-clínicos (em animais) estão em andamento.

Para Larry Gouture, do Centro para o Desenvolvimento de Tecnologias Aplicadas da organização City of Hope ("Cidade da Esperança"), nos EUA, o baixo número de estudos clínicos com células embrionárias é reflexo do estágio ainda desbravador das pesquisas nessa área - tanto do ponto de vista científico quanto regulatório, o que dificulta a aprovação dos primeiros projetos com seres humanos.

"Eu sei de cinco ou seis novos projetos que deverão ser aprovados (nos EUA) nos próximos cinco anos", diz. "Se você pensar que a primeira linhagem de células-tronco embrionárias humanas só foi estabelecida em 1998, é um número bastante satisfatório", completa, lembrando que é normal novas drogas ou terapias levarem dez anos ou mais para serem testadas e aprovadas. Promessas. Couture tem milhões de razões para apostar no sucesso das células embrionárias. Seu laboratório produz milhões delas continuamente para abastecer projetos de pesquisa do Instituto de Medicina Regenerativa da Califórnia (Cirm), que : é um de seus financiadores.

Vários dos projetos do Cirm utilizam células derivadas de céIlulas-tronco de embriões humanos. Uma das apostas mais promissoras nesse portfólio é a da terapia celular para cura da diabete tipo 1, que já recebeu mais de US$ 40 milhões.

A estratégia é transformar células-tronco embrionárias em células pancreáticas produtoras de insulina, para serem encapsuladas em uma película e implantadas debaixo da pele, quase como um adeisivo de nicotina. "É como se fosse um pâncreas numa cápsula", diz o presidente do Cirm, Alan Trounson. "Já estamos curando ratos e camundongos. Precisamos espérar para ver se vai funcionar em seres humanos também, mas eu acredito que vai."

Outra aposta é na cura da degeneração da mácula e outras formas de cegueira, por meio da reconstrução da retina com células derivadas de células-tronco embrionárias, que já recebeu cerca de US$ 50 milhões e está em estágio avançado de pesquisa com animais.

Nesse caso, o Cirm concorre com a empresa Advanced Cell Technology (ACT), responsável pelos dois estudos clínicos com células-tronco embrionárias em andamento nos EUA. Ambos são aplicados a doenças da retina e, ironicamente, são executadas na Califórnia, apesar de a ACT ser uma empresa de Massachusetts.

O primeiro estudo clínico com células-tronco embrionárias humanas aprovado nos EUA e no mundo, em 2010, foi engavetado pela empresa Geron (também da Califórnia), por justificações financeiras. A pesquisa envolvia o uso de células neuronais derivadas de células embrionárias para a regeneração de lesões medulares.

Devolver os movimentos a pes soas paralisadas é um dos grandes "sonhos" associados às pesquisas com células-tronco. Os estudos pré-clínicos com animais são encoraj adores, mas é preciso manter os pés no chão, segundo o especialista Brian Cummings, da Universidade da Califórnia emlrvine. "Fazer pessoas levantarem da cadeira de rodas seria ótimo, mas não é nosso objetivo principal" diz. "Se conseguirmos devolver alguma sensação, algum movimento, ou talvez o controle de bexiga, já será um avanço muito importante." Cummings conduz um estudo clínico em lesão medular, utilizando células-tronco neuronais de origem fetal. Também tem projetos com lesões cerebrais; e faz uma ressalva. "Vinte e nove estudos clínicos sobre lesão cerebral já foram feitos com células-tronco nos EUA, e todos falharam, apesar de resultados pré-clínicos promissores."