Título: Meta da inflação está mantida, sem afetar crescimento
Autor: Abreu, Beatriz
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/10/2012, Economia, p. B4

Ter uma convergência mais rápida da inflação para o centro da meta poderia sacrificar o crescimento, diz Barbosa

A crise financeira internacional levou o governo a uma adaptação na administração da política econômica para conduzir a velocidade da trajetória de queda da taxa de juros e evitar um comprometimento maior da atividade econômica.

A afirmação é do ministro interino da Fazenda, Nelson Barbosa, para explicar a necessidade de um equilíbrio entre a velocidade, o prazo e a intensidade de queda dos juros para a convergência da inflação para o centro da meta, fixado em 4,5%, sem prejudicar o crescimento econômico.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Essa visão diferenciada para a questão fiscal, quebra de paradigmas da política monetária e da meta de inflação é uma mudança na política ou é circunstancial?

Não acho que teve mudança. Continuamos com o mesmo arcabouço institucional de política econômica com meta de inflação, meta de resultado primário e não temos meta de câmbio. O que nós temos é a administração da política econômica para se adaptar a esse contexto internacional extraordinário.

Onde a política ainda é expansionista.

Basta lembrar que, em termos de política monetária na Europa e nos Estados Unidos, os Bancos Centrais estão recorrendo a métodos não usuais de administração monetária com a taxa de juros próxima de zero. Na impossibilidade de adotar estímulo fiscal para recuperar suas economias, eles se concentram muito, talvez até em demasia, em estímulos monetários. E isso tem efeitos. Exige que o resto do mundo se adapte. Nós, mantendo nosso arcabouço de meta de inflação, meta de resultado primário e câmbio flutuante, adaptamos o dia a dia para lidar com essa situação.

Mas não estamos perseguindo o centro da meta.

A meta de inflação continua importante. Achamos que a inflação vai convergir para o centro da meta ao longo de 2013. O último Relatório Trimestral de Inflação, do Banco Central, coloca 4,5% na segunda metade de 2013. Não há que se falar em abandono do centro da meta.

É um ritmo mais lento.

Nós temos uma economia que desacelerou no último ano e meio. Ter uma convergência mais rápida poderia sacrificar o crescimento além do necessário. No contexto que estamos, pode parecer contraditório, mas acelerar o crescimento contribui para o cumprimento da meta. Acelera o crescimento da produtividade do trabalho, que é uma variável pró-cíclica. Todos os economistas conhecem essa relação. Houve desaceleração da economia, mas não houve uma desaceleração forte do crescimento do emprego porque as empresas estão mantendo seus empregos. E estão mantendo porque acreditam que a economia vai se recuperar.

Essa nova execução da política econômica não é contraditória?

Estamos numa situação em que não há contradição aparente. O que há é uma situação internacional extraordinária que exige adaptações dessas velocidades de cumprimento das metas. O carro continua o mesmo, com volante, marcha, pedal, freio. Só que a estrada é diferente.

E qual o combustível para o câmbio?

O câmbio, por causa dessa situação internacional anômala, pode ter pressões excessivas pela valorização do real no curto prazo. Essas políticas de expansão monetária nos EUA e Europa têm um lado positivo de, na ausência de uma política fiscal, serem uma segunda melhor opção para evitar um aprofundamento da crise. O problema é que nem toda essa liquidez injetada permanece nessas economias. É inevitável que uma parte vaze para o resto do mundo, o que mexe no preço das commodities e acaba gerando uma valorização das outras moedas.

E como fica o câmbio?

Neste momento, uma valorização adicional da nossa moeda tem mais efeitos negativos do que positivos. Por isso, o governo toma medidas para evitar uma valorização maior da moeda, mas sem se comprometer com uma taxa. Não está escrito em nenhum lugar que o governo tem meta formal de câmbio de R$ 2 e alguma coisa. Isso é opinião do mercado. O governo não tem compromisso formal com o valor da taxa de câmbio. Mas isso não quer dizer que não liga para a taxa de câmbio.

Está constatado o quadro de maior entrada de capital externo?

Ainda não. Teve o anúncio do QE3. Tem a liberação de recursos que é cumulativa e começa com US$ 40 bilhões, US$ 80 bilhões, US$ 120 bilhões por mês. Esperamos e torcemos que essa política dê certo, a economia americana se recupere e a maior parte desse dinheiro permaneça nos EUA.

É preciso alguma outra medida preventiva?

Eu já falei que medida cambial a gente não anuncia antes. A gente toma a medida na hora que acha necessário e explica depois. Acompanhamos o dia a dia do mercado de câmbio e vamos monitorando.

Os bancos privados estão dizendo que com a redução das tarifas terão menos lucro e vão pagar menos impostos. É fato?

Vamos esperar. Os bancos, com uma tarifa menor, podem atrair mais clientes e aumentar o volume de negócios. Tanto na taxa de juros quanto nas tarifas, a lógica que tem orientado nossa posição é de que é possível ter o mesmo lucro com uma base maior. É a mesma lógica da Reforma Tributária, de manter a mesma arrecadação com uma alíquota menor. Vamos ver como os bancos respondem.

O debate em torno do spread arrefeceu?

O spread continua a ser um ponto de atenção e preocupação. Houve melhora com uma queda de 5 a 6 pontos porcentuais nos últimos 12 meses, se comparada com números do Banco Central. Parte disso é tributação, com a redução do IOF, e parte é a dinâmica da concorrência. Falando como presidente do conselho do Banco do Brasil, é possível ter um mesmo lucro ou um lucro maior com um spread menor. Quando cai a taxa de juros, também cai a inadimplência.

Os bancos privados alegam que não têm o Tesouro para serem capitalizados, como a Caixa e o Banco do Brasil.

No cenário atual de alta liquidez que está aí, eles têm possibilidade de captar recursos a taxas bem baixas. É bom lembrar que Caixa e Banco do Brasil fazem também políticas públicas. Os recursos do Tesouro no Banco do Brasil são para complementar o financiamento da safra agrícola, que é concentrado no BB. A maior parte dos privados não financia no volume desejado. O dinheiro para a Caixa é para financiar a expansão do Minha Casa, Minha Vida, seja para material de construção ou compra de móveis. São recursos públicos para financiamento de políticas públicas.