Título: Incra tem ‘latifúndio’ em área nobre de Brasília
Autor: Domingos, João; Nossa, Leonêncio
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/10/2012, Nacional, p. A6
Tamanho dos Lotes nos Lagos Norte e Sul varia de 800 a 1.400 metros quadrados; autarquia é proibida de vendê-los
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) é dono de um latifúndio improdutivo constituído de 50 lotes nos dois bairros mais nobres de Brasília, os Lagos Norte e Sul. Cada lote tem de 800 a 1.400 metros quadrados. Localizados em áreas residenciais, em nenhuma delas há construções. Para impedir que se transformem em depósito de lixo, sejam tomados pelo capinzal ou acabem invadidos, o órgão fincou uma plaquinha na frente de cada um dos terrenos: "Propriedade do Incra".
A autarquia não pode vender nem trocar nenhum dos terrenos. Por força de mudanças na leigislação, feitas durante o governo do ex-presidente Fernando Collor, eles passaram para a lista dos bens comuns da União, administrados pela Secretaria do Patrimônio, ligada ao Ministério do Planejamento. Mas a propriedade ainda é do Incra e cabe à autarquia zelar para que os lotes estejam sempre limpos.
Esse latifúndio urbano da autarquia responsável justamente por identificar terras improdutivas, desapropriá-las e nelas fazer a reforma agrária, vale pelo menos R$ 55 milhões, conforme avaliação de corretores de imóveis que atuam no mercado de Brasília. A direção do Incra informou, por intermédio de sua assessoria, que "está de mãos amarradas", porque a legislação não permite que se faça nenhum tipo de negócio com os terrenos.
Lei. O presidente do Incra, Carlos Guedes, torce para que o Congresso aprove uma lei que devolva ao instituto o direito de comercializar os imóveis. Se isso ocorrer, ele tentará fazer um escambo com algum dono de terreno comercial no centro de Brasília.
Os lotes foram adquiridos pela direção do Incra em 1972, quando os Lagos Norte e Sul ainda eram imensos matagais e o próprio governo federal construía lá as mansões que iriam servir aos ministros e aos burocratas da administração federal. Essas mansões serviriam de chamariz para que a população comprasse lotes nos dois bairros e construísse lá também.
A ideia do Incra era levantar residências para a direção da autarquia, criada em julho de 1970 pelo governo do general Emílio Garrastazu Médici. Mas a proposta nunca foi para a frente e nenhum tijolo foi posto nos lotes. Os terrenos permaneceram do jeito que foram adquiridos, sempre correndo o risco de servir de abrigo para ratos, cobras e outros bichos. Para sorte do Incra, por ser um órgão do governo federal, a autarquia é isenta do pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). Um terreno sem edificações nos dois bairros mais valorizados de Brasília paga, em média, de R$ 10 mil a R$ 15 mil por ano de IPTU. Na época em que o Incra adquiriu os lotes, o governo federal tocava uma frente de obras na Península dos Ministros. Construía lá as casas destinadas aos ministros, a dirigentes de estatais, fundações e autarquias e aos presidentes da Câmara e do Senado. Quando assumiu o governo, o então presidente Fernando Collor vendeu quase todos imóveis da Península dos Ministros e os imóveis da União por um preço mais do que camarada para quem os ocupava no momento.