Título: Visita de Merkel provoca confronto nas ruas de Atenas
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/10/2012, Economia, p. B8

Manifestantes protestaram contra política de austeridade exigida pela Alemanha como contrapartida ao pacote de socorro à Grécia

Bandeiras nazistas queimadas e enfrentamentos entre a polícia e manifestantes na Praça Syntagma marcaram ontem a visita da chanceler da Alemanha, Angela Merkel, a Atenas.

O encontro de Merkel com o premiê da Grécia, Antonis Samaras, o primeiro desde o início da crise das dívidas soberanas, em dezembro de 2009, não resultou em novas medidas de austeridade. Mas ainda assim sindicalistas, militantes partidários e "indignados" pediram nas ruas o fim da política de rigor, apontando a líder alemã como culpada pela depressão da economia do país, cujo desemprego superou os 20% nos últimos cinco anos.

A visita "de cortesia" mobilizou cerca de 30 mil manifestantes e 6,5 mil policiais, que isolaram o Parlamento, no centro de Atenas. Os manifestantes carregavam faixas com mensagens que associavam Merkel ao nazismo - como "Fora imperialistas" e "Não ao 4.º Reich".

Grupos radicais também destruíram fotografias da chanceler e dos últimos primeiros-ministros da Grécia, além de queimar duas bandeiras nazistas próximo às barricadas da polícia. Como nos protestos anteriores, houve conflito entre as forças de ordem e os manifestantes.

Em paralelo ao encontro de chefes de governo, líderes de dois partidos de extrema esquerda da Alemanha e da Grécia, Bernd Rixinger, do Die Linke, e Alexis Tsipras, do Syriza, se reuniram para discutir uma estratégia conjunta para enfrentar a política de austeridade de Merkel e da União Europeia.

Enquanto as hostilidades aconteciam do lado de fora, a chanceler foi recebida por Samaras no Parlamento. Em pronunciamento, Merkel elogiou "os progressos conquistados" pela Grécia e se solidarizou ao esforço, lembrando a reunificação alemã nos anos 1990. "Por vir de um país do leste, eu sei muito bem que as reformas vão tomar bastante tempo", disse ela.

"Muito já foi feito. Há muito ainda a fazer, e a Alemanha e a Grécia trabalharão juntos e estreitamente. Se não resolvermos os problemas agora, eles se manifestarão mais tarde de forma ainda mais grave." A seu lado, Samaras reiterou o desejo dos gregos de continuarem entre os países que adotam a moeda única, apesar das dificuldades. "Eu ressalto à chanceler que o povo grego sangra, mas ele está determinado a permanecer na zona do euro", assegurou.

Pelo menos em público, o premiê não voltou a pedir a renegociação do programa de resgate concedido pela União Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), o que ele havia solicitado nessa semana, sem sucesso. O encontro entre os dois líderes resultou em rumores sobre a liberação de uma parcela de € 31,5 bilhões do plano de socorro ao país até o fim de novembro - quando, sem novos recursos, os cofres do país ficarão vazios.

Novo imposto. Sem o anúncio de nenhuma medida de impacto na Grécia, a surpresa ontem ocorreu em Bruxelas. Em nova reunião do Eurogrupo - o fórum de ministros de Finanças -, representantes de 11 países anunciaram a adesão ao projeto franco-alemão de criação de um imposto sobre transações financeiras. Após um apelo lançado na semana passada pelos ministros Pierre Moscovici, da França, e Wolfgang Schäuble, da Alemanha, Itália e Espanha concordaram em participar. Completam a lista Bélgica, Portugal, Eslovênia, Áustria, Grécia, Eslováquia e Estônia - países que somam 85% do PIB da zona do euro.

Por ora, duas grandes economias da UE, o Reino Unido - responsável por dois terços de todas as movimentações financeiras do continente - e a Holanda ficaram de fora, assim como Suécia e Finlândia. Isso porque a proposta continua a causar polêmica. Para o comissário europeu de Impostos, Algirdas Semeta, a taxa representará "uma fonte de receitas novas provenientes de um setor insuficientemente taxado". Já para Jan Kees de Jager, ministro das Finanças da Holanda, o imposto terá "resultados devastadores" para a Europa.