Título: Mundo segue de perto eleição nos EUA
Autor: Barry, Ellen
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/10/2012, Internacional, p. A19

A cobertura da campanha presidencial nos EUA pela mídia estatal da Rússia é i ocultada por uma camada de declarações sarcásticas e qualificada por comentaristas influentes como uma guerra de difamações ou um “concurso de beleza" em que candidatos idênticos brigam pelo voto dos eleitores. Mas, para os que acreditam que a Rússia não tem nada a perder, o debate de segunda-feira serviu para deixar as coisas mais claras.

Ontem, um conhecido analista deu o veredicto. “Se Mitt Romney vencer, não significa que as relações entre Rússia e EUA se deteriorarão. Elas ficarão suspensas. E por um longo tempo”, escreveu Fiodor Lukyanov. O modo como os outros países cobrem a disputa indica como eles estão se sentindo com relação a si próprios e como veem o processo político americano.

Repórteres japoneses [ acompanharam os candidatos, examinando as táticas i que poderiam servir de modelo para o vibrante sistema biparti-dário que o Japão gostaria de instituir. Os brasileiros, familiarizados com ícones americanos, estudam minuciosamente os detalhes e se dizem chocados com a ideia de Romney de acabar com o subsídio para a rede pública de TV, cujo pássaro é chamado de Garibaldo na versão local de Vila Sésamo.

Em outros países, como Rússia e China, a cobertura é muda, refletindo uma cautela com a retórica belicista de Romney e decepção com a política externa de Obama. Na verdade, a desilusão aplacou um pouco a cobertura em muitos países, mesmo na Alemanha, nação entusiasmada com os mistérios da política americana.

Ao contrário de 2008, quando a cobertura das primárias democratas foi exaustiva, com notícias estampadas nas primeiras páginas dos jornais, agora as análises são mais sóbrias e menos entusiastas. “Em 2008, todos perguntavam ‘onde está o Obama alemão?”", disse Ghristoph von Marschall, chefe do escritório do jornal Tagesspiegel em Washington. “Ninguém pergunta isso mais. Obama não é mais um messias. Apenas um político normal e, às vezes, ruim.”

No Japão, jornais e noticiários de TV trazem reportagens sobre a campanha, ressaltando as gafes e revezes dos candidatos com análises que pareceriam muito entusiastas em jornais americanos. Tal entusiasmo, porém, é de cunho prático. Há três anos, uma eleição histórica pôs fim ao sistema de partido único que vigorou durante 57 anos no Japão e seus líderes a buscam um modelo bipartidário.

Embora a América Latina não seja um tema de campanha, os brasileiros mostram-se fascinados à medida que a campanha chega na sua reta final com os dois candidatos empatados.

O colunista Elio Gaspari, no domingo, dissecou uma série de eventos em que Romney e Obama dividiriam o Colégio Eleitoral com 269 votos cada um, levando a disputa para a Câmara dos representantes. Desta maneira, Romney poderia vencer mesmo que Obama conquistasse o voto popular. “A democracia americana parece terrível sob esse prisma”, escreveu.

Essa perspectiva dramática não chega aos espectadores chineses. Embora o principal canal de TV nacional, o CCTV, tenha aberto um grande escritório em Washington, a disputa americana não tem um grande espaço nas notícias e nenhum jornalista chinês foi enviado para seguir os candidatos em sua campanha.

Em parte, é uma questão de oportunidade: a eleição nos EUA ocorre dois dias antes da abertura do 18º Congresso do Partido Comunista da China, que anunciará novos líderes. O capital é consumido por suas I próprias disputas internas e é assim que o alto escalão do governo encara Romney e Obama.

A campanha despertou o interesse de chineses que mantêm contatos frequentes com os americanos. Estudantes e jovens trabalhadores dizem estar fascinados com o debate aberto e com as que seriam as grandes diferenças entre os dois partidos. “O confronto de ideologias nos EUA é muito mais intenso do que na China”, disse Guan Xin, que traduz programas americanos, como The Daily Show e Real I Times With Bill Maher.

I Na Rússia, a cobertura também é silenciosa. A eleição americana ocorre após uma série de três eleições sem disputa na Rússia que ampliaram o poder do presidente Vladimir Putin. Autoridades russas estão mais preocupadas em controlar os dissidentes e afirmam que o Departamento de Estado dos EUA é responsável pelo aumento do ativismo contra o governo.

Na TV, veículo que influencia muito a opinião pública, os comentários sobre a eleição americana têm sido negativos. Por trás do desdém de alguns comentaristas, existe a preocupação com a vitória de Romney e o que ela significai ria para a Rússia, especialmente depois do debate de segunda-feira, quando ele acusou Obama de ser submisso com relação a Putin.

Alguns membros radicais no Kremlin, que j á adotaram o antiamericanismo, podem considerar Romney, que afirmou que a Rússia é “o nosso inimigo geopolítico principal”, um instrumento útil para levar sua mensagem.