Título: Mudanças e permanências
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/10/2012, Notas e Informações, p. A3

São notáveis as mu­danças ocorridas nos últimos anos no perfil da família brasileira, no papel da mulher no domi­cílio e no mercado de trabalho e na ta­xa de fecundidade, entre outros indi­cadores, mas o crescimento da eco­nomia não foi suficiente para elimi­nar velhas mazelas sociais típicas de países subdesenvolvidos, como a precariedade da moradia de quase metade dos brasileiros. Os dados do Censo 2010 divulgados pelo IBGE mostram um Brasil de contrastes, que melhora rapidamente em diver­sos aspectos, mas não consegue evi­tar a persistência de graves proble­mas, sobretudo entre as camadas mais pobres.

De 57 milhões de domicílios brasi­leiros, só 30 milhões, ou 52,5%, são considerados adequados, ou seja, não têm mais de dois moradores por dormitório e dispõem de abasteci­mento de água por rede pública, de coleta de esgoto sanitário por rede pública ou sistema de fossa sanitária e de coleta regular de lixo. Isso signi­fica que são inadequados 27 milhões de domicílios, onde vivem quase 105 milhões de brasileiros. Além disso, cresceu o número de famílias que di­videm suas moradias, indicador do déficit habitacional do País. Eram 6,5 milhões (13,9% do total) em 2000 e passaram para 8,3 milhões (15,4%) em 2010.

A situação já foi pior. Em 2000, na­da menos do que 56,1% das mora­dias eram consideradas inadequa­das. A melhora, porém, tem sido len­ta, e os obstáculos institucionais, ad­ministrativos e financeiros à execu­ção dos ambiciosos programas nacio­nais de saneamento básico e de recu­peração urbana tendem a retardar a necessária mudança desse quadro.

Bem mais rápida tem sido a transformação do perfil das famílias. O número de mulheres chefes de famí­lia, por exemplo, dobrou entre o Censo de 2000 e o de 2010, passan­do de 9,048 milhões para 18,617 mi­lhões. O Censo de 2010 contabilizou 49,9 milhões de chefes de famí­lia no País. As mulheres são 37,3% do total; dez anos antes, eram 22,6%.

Para o IBGE esse aumento reflete a maior presença das mulheres no mercado de trabalho e melhor esco­laridade. Também a diminuição da taxa de fecundidade favorece o for­talecimento fio papel da mulher na família. "A tendência é que esse ce­nário continue nos próximos anos", diz o técnico da área de população e indicadores do IBGE Gilson Gonçal­ves de Matos.

Há alguns aspectos dessa mudan­ça, no entanto, que não são positi­vos. Estudos específicos sobre as mulheres chefes de família têm constatado que elas têm menos tem­po de estudo e salários menores do que os homens que também são che­fes de família. A renda do trabalho da mulher, não apenas das chefes de família, representa 70,4% da renda do trabalho do homem, de acordo com a Pesquisa Nacional de Amos­tra por Domicílio (Pnad) de 2011.

O Censo de 2010 mostrou nova queda da taxa nacional de fecundida­de, que chegou a 1,86 filho por mu­lher, a menor de toda a série do IBGE. Como a taxa de fecundidade necessária à reposição da população é de 2,1 filhos por mulher, a taxa na­cional constatada pelo Censo indica que, a partir de 2030, a população brasileira começará a diminuir.

O Censo mostra um novo perfil das famílias. É crescente o número de uniões informais, de casais sem filhos e de casamentos inter-raciais. Cresce também o número de separa­ções e de divórcios. Há também mais uniões consensuais, de casais que vivem sob alguma forma de união conjugal não formalizada nem no civil nem no religioso. En­tre 2000 e 2010, esse tipo de união passou de 28,6% para 36,4% do to­tal. Além de uma espécie de acordo de experiência antes da constitui­ção da união formal, também a ques­tão econômica estimula essa forma de união, que não requer gastos com festas. "Houve uma mudança cultural, iniciada pelos jovens", dis­se a pesquisadora do IBGE Ana Lú­cia Saboia.

Em decorrência do aumento dos divórcios, tem aumentado também o número de famílias reconstituí­das, com filhos só de pai, só de mãe e de ambos. O IBGE constatou a existência de 4,446 milhões de lares com esse tipo de formação familiar. Isso representa 16,3% dos lares de casais com filhos.