Título: O recuo da Aneel
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/10/2012, Notas e Informações, p. A3

Desautorizado pu­blicamente pelo ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Luiz Inácio Adams, o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Nelson Hub­ner, teve de recuar e rever as ameaças que fizera, na semana passada, às concessionárias do setor elétrico que não aceitas­sem, até a segunda-feira (15/10), as condições impostas pelo go­verno para a renovação das con­cessões. Hubner dissera que a Aneel poderia impedi-las de par­ticipar de novas licitações.

Foi um recuo parcial. "Em te­se, podem participar, mas isso será discutido mais adiante", disse Hubner ao jornal Valor (17/10), durante encontro em São Paulo em que autoridades, dirigentes de empresas e inves­tidores do setor elétrico discuti­ram as regras da Medida Provi­sória (MP) 579 para a renova­ção das concessões que vencem entre 2015 e 2017. O ministro-chefe da AGU, no entanto, dei­xou claro que não há o que dis­cutir - nem agora nem "mais adiante" - a respeito da partici­pação das concessionárias nos novos leilões. "Se o concessio­nário achar que as condições (estabelecidas pela MP) não são adequadas, ele pode entre­gar o ativo e participar da licitacão", afirmou Adams.

O esclarecimento do chefe da AGU elimina parte das incer­tezas e da insegurança geradas pela decisão do governo de edi­tar às pressas, sem consulta am­pla ao setor, uma MP tão com­plexa, que envolve cálculos de indenizações estimadas em bi­lhões de reais e alterará a renta­bilidade das empresas da área, entre elas a estatal Eletrobrás. Louve-se, a propósito, o gesto do diretor-geral da Aneel de re­conhecer o "atropelo" na defi­nição das novas regras, pelo qual pediu desculpas. Na tenta­tiva de dar um pouco de tran­qüilidade para o setor, disse que "as coisas serão ajustadas ao longo*, do tempo".

Por decisão do próprio gover­no, porém, o tempo é muito cur­to. Foi exíguo para as concessio­nárias manifestarem o interes­se em renovar as concessões, mesmo sem conhecer os crité­rios que balizarão os cálculos da indenização. Assim, elas tive­ram de decidir "no escuro" em termos financeiros. Mas isso foi apenas o início. Uma decisão su­ficiente apenas para garantir às concessionárias a possibilidade de poder optar pela renovação da concessão. Elas continuarão pressionadas a decidir com rapi­dez. Até o dia 1° de novembro, o governo divulgará a fórmula do cálculo das indenizações por investimentos não amortizados e as concessionárias terão de aceitar ou rejeitar essa fórmula até o dia 4 de dezembro.

Mas isso é só uma parte, tal­vez a menos complicada, dos problemas criados pela MP. Os controladores de 14 das 123 usi­nas cujas concessões vencerão nos próximos anos não pedi­ram a renovação da concessão. Dessas, as que causam maior preocupação são três operadas pela estatal estadual Cemig, de Minas Gerais — as Usinas de Jaguara, São Simão e Miranda.

A resposta do governo beira o simplismo. O concessionário que não quiser aderir às novas regras mantém o ativo até o fim da concessão; "depois, a usina volta para o Estado, que decide se licita ou explora de outra for­ma o ativo", disse o secretário executivo do Ministério de Mi­nas e Energia, Márcio Zimmermann. O presidente da Cemig, Djalma Morais, no entanto, ga­rante que o contrato de conces­são dessas usinas assegura sua renovação por 20 anos nas con­dições atuais - e é isso que a em­presa pretende obter.

Se não tiver êxito nas negocia­ções com a Aneel e com o gover­no Dilma, a diretoria da Gemig espera contar com a colabora­ção do Congresso para que o di­reito por ela invocado lhe seja assegurado. No Congresso está outro foco de dificuldades para o governo fazer avançar seu pro­jeto para o setor elétrico. Insta­lada na quarta-feira passada, a comissão especial mista do Congresso que vai analisar a MP 579 terá muito trabalho. A MP recebeu 431 emendas de de­putados e senadores, entre as quais uma que prevê a possibili­dade de renovação, nas condi­ções atuais, de concessões que nunca foram prorrogadas, co­mo as das três usinas da Gemig e também a da Usina Três Irmãos, da estatal paulista Cesp.

Mesmo que todas essas ques­tões sejam superadas, ainda res­tará o problema do cálculo das indenizações.