Título: Soja e milho devem garantir outro ano de receita recorde
Autor: De Chiara, Mácia
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/10/2012, Ecomia, p. b18

Os efeitos da crise internacional atingiram boa parte da agricultura brasileira, mas eles estão camuflados pelo excelente desempenho da soja e do milho. Os preços desses produtos foram impulsionados pela quebra da safra passada de soja dos Estados Unidos, dos Estados do sul do Brasil e da Argentina.

Também ajudaram o volume significativo de investidores financeiros apostando nos mercados futuros de grãos e a valorização do câmbio. Com isso, milho e soja, que já garantiram uma receita recorde para a agricultura neste ano, devem repetir e ampliar esse resultado em 2013.

A safra de grãos que está sendo plantada no centro-sul do País, e será colhida em março do ano que vem, e as produções de café, cana, fumo e laranja devem somar um faturamento bruto para os agricultores de R$ 257 bilhões em 2013, segundo projeções da RC Consultores. A cifra é 7% maior que a embolsada neste ano, de R$ 239,7 bilhões. Os cálculos da consultoria consideram dados de produção e preços do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Fundação Getúlio Vargas.

Quase a totalidade do crescimento da receita agrícola de R$ 17,3 bilhões projetada para o ano que vem, em relação a de 2012, virá da soja, com R$ 13,2 bilhões, e do milho, com R$ 3,9 bilhões, observa o sócio da consultoria e responsável pelas projeções, Fabio Silveira. "Nos demais cultivos não há avanço, o que mostra que a crise atingiu um bom pedaço da agricultura. Ainda bem que a soja e o milho continuam crescendo, o que deve irrigar a economia do interior do País, o consumo e a arrecadação de impostos", diz o economista.

Em Mato Grosso, o principal Estado produtor de soja e que deve colher cerca de um terço da safra nacional projetada em 78,5 milhões de toneladas, mais de 60% da soja já está vendida, conta o presidente da Associação dos Produtores de Soja do Mato Grosso (Aprosoja-MT), Carlos Fávaro. No ano passado, nesta mesma época, a venda antecipada de soja correspondia à metade da produção do Estado.

Soja verde. Esse movimento de forte venda da soja verde para aproveitar os preços elevados se repete em todo o País, aponta um levantamento da consultoria Safras &Mercados. No início deste mês, 46% da próxima safra nacional de soja estava comercializada, ante 30% em igual período do ano passado e 23% da média histórica.

Fávaro explica que os preços em alta fizeram com que o produtor ampliasse a venda da soja verde. Neste ano, a saca de 60 quilos está cotada em US$ 24, bem acima da média histórica, que oscila entre US$ 18 e US$ 20.

"A liquidez na soja é muito grande, é dinheiro vivo no bolso do produtor ", afirma o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, Mauro Rezende. Ele explica que a valorização de preços reflete, além de fatores objetivos, como a quebra de safra dos EUA, do Brasil e da Argentina, que levaram os estoques aos níveis mais baixos dos últimos tempos aqui e no exterior, uma "financeirização" dos mercados agrícolas com fundos investindo em commodities. "Há uma sobreposição de fatores", ressalta Silveira, da RC.

Mas o presidente da Aprosoja-MT acrescenta outro fator, além dos já conhecidos, que melhorou as perspectivas da soja: o câmbio. No ano passado, o dólar estava cotado nesta época do ano a R$ 1,7 e fechou sexta-feira em R$ 2,02. Isso significa que os preços da soja subiram tanto em dólar como em reais. "A soja está sendo favorecida pela seca e pelo câmbio. Mas existe um problema pela frente que é logística para escoar a maior produção", alerta Fávaro.

Afetada pela expansão da soja, a área plantada com milho deve recuar na safra de verão e na safrinha, diz o consultor da Safras & Mercados, Paulo Molinari. Sem grandes avanços na produção e com estoques baixos, a perspectiva é que os preços do milho, puxados pelas exportações recordes neste ano, continuem firmes até março. A partir daí, entrará no mercado a nova safra de milho da Argentina e as cotações podem mudar. Hoje o preço da saca de milho oscila entre R$ 33 e R$ 32, ante um patamar bem mais baixo no mesmo período do ano passado: entre R$ 26 e R$ 27 por saca, observa o consultor.

Em baixa. Enquanto soja e milho serão mais uma vez as estrelas da safra, algodão e café, entre outros produtos, por exemplo, mostram o impacto da crise mundial. Nas contas da RC Consultores, a receita bruta dos produtores de algodão e café em reais deve encolher 8,7% e 17%, respectivamente, em 2013 na comparação com a obtida neste ano.

No caso do algodão, que é usado basicamente na fabricação de roupas, a oferta da fibra cresceu e a demanda mundial desacelerou, diz Silveira. "Os asiáticos perderam mercado na Europa com a retração da economia, os estoques subiram e o preço desabou." Com isso, produtores de algodão migraram para a soja.

No café, o movimento é semelhante. Depois da crise de 2008, houve um movimento de recuperação de todas as matérias-primas agrícolas e também do café, com os preços do produto atingindo o ápice em 2011. Em maio daquele ano, a saca chegou a valer R$ 560 no sul de Minas.

Mas a partir de meados do ano passado, diz o consultor da Safras & Mercados, Gil Barabach, quando a crise mundial se agravou e ficou claro que os países ricos, grandes consumidores de café, como Estados Unidos, Japão e o bloco da União Europeia, não iriam crescer como se esperava, os preços caíram e hoje estão 30% menores. "E o quadro piorou este ano, quando o Brasil, o maior produtor mundial, colheu safra recorde de 54,9 milhões de sacas."