Título: Brucutu, o algoz de Ibiúna, agora apoia dirceu
Autor: Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/11/2012, Nacional, p. A11

Ex-agente do Dops que prendeu o então líder da UNE em 68 hoje troca até e-mails com ele

José Dirceu de Oliveira e Silva não ficará isolado se a prisão for o seu destino. Mesmo no regime fechado, se assim decidir o Supremo Tribunal Federal, ele poderá receber a visita da família, dos amigos, dos advogados e do algoz de Ibiúna.

Herwin de Barros, o Brucutu, que munido de um porrete e um ancinho escoltou o líder estudantil para o Dops, naquela tarde chuvosa e fria de outubro de 1968, se declara disposto a "levar conforto e amparo" ao ex-ministro chefe da Casa Civil, com quem troca e-mails desde que teve início o julgamento do mensalão.

"Caro amigo Zé Dirceu, a despeito de tudo e todos, sei o quanto és aguerrido, pois, a batalha é árdua e a guerra longeva", escreveu o ex-agente da polícia política, no início de agosto, antes de o Supremo abrir a longa série de sessões que decidiram a sorte dos mensaleiros.

"Prezado amigo Herwin, com gratidão e palavras outras sempre agradecerei a solidariedade. Abraços, Zé", respondeu o petista.

Brucutu, 68 anos - dois a mais que seu antigo refém e prisioneiro -, hoje o advogado 143.577, sua inscrição nos assentamentos da OAB, faz pouco da tese do domínio do fato, que derrubou Dirceu. A teoria prega que o ocupante de alto cargo pode contribuir definitivamente para um crime - ainda que não tenha participado diretamente dos fatos - pela posição de influência que ocupa. "É uma coisa ridícula", sentencia o ex-policial.

No dia em que a corte impôs o primeiro revés a Dirceu, condenando-o por corrupção ativa, Brucutu enviou nova mensagem e invocou frase de Souza Neto, douto procurador. "A Justiça vive de provas, somente o monstro do arbítrio alimenta-se da presunção." O ex-ministro devolveu: "Grato pela solidariedade de sempre. Zé".

O que leva um homem que serviu à liturgia dos porões, e que a lei não conheceu, a declarar apoio ao suposto chefe do mensalão? "Ele (Dirceu) era um estudante, nós éramos contemporâneos. Aquele dia eu disse a ele: "Se vocês fossem expropriadores de bancos iriam ver quem é o Brucutu."

Tanto tempo passou, 44 anos, e Brucutu ainda guarda na memória cada minuto, cada detalhe, cada passo nas cercanias de Ibiúna. O poder era ele.

"Não encostei a mão em José Dirceu, ele é agradecido a mim até hoje", jura de pés juntos. "Eu sempre gostei de arma branca. Se eles fossem para o confronto iam ter de invadir as minhas entranhas. Meus superiores ordenaram que eu interrogasse (Dirceu) em algum recôndito da mata, era para ser um diálogo radical. Eu era muito forte. No mínimo ele teria hoje boa sequela plégica. Mas eu me recusei."

No camburão, uma Rural Willys, tomaram o rumo do Dops. "Missão dada é missão cumprida para quem usa viseira. Eu pensei: ordem manifestamente ilegal jamais vão me fazer cumprir."

Brucutu conta que não se prestou nem ao papel de condutor do flagrante contra o jovem estudante, por violação à Lei de Segurança Nacional. "Foi um dia impressionante", relata o ex-tira de muitas histórias e entreveros. Lá embaixo, o Largo General Osório, que se estende à frente do símbolo do arbítrio - a construção centenária de tijolos vermelhos. Muitas são as famílias em vigília, à espera de informações sobre seus entes encarcerados. "Era uma colmeia ouriçada", lembra Brucutu.