Título: Ex-diretor de agência combinou depoimento com ex-senador
Autor: Boghossian, Bruno ; Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/12/2012, Nacional, p. A14

Tiago Pereira Lima foi encontrado pela PF em casa de Gilberto Miranda, suposto beneficiado do esquema de pareceres

O ex-diretor da Agência Nacio­nal de Transportes Aquaviários (Antaq) Tiago Pereira Lima com­binou com o ex-senador Gilber­to Miranda, indiciado na Opera­ção Porto Seguro, as informa­ções que daria em seu depoimen­to à Polícia Federal. Um telefone­ma entre os dois foi interceptado pelos investigadores no dia da de­flagração da operação.

Segundo a PF, o ex-diretor da Antaq assinou um parecer que be­neficiou a construção de um por­to privativo do interesse de Mi­randa na Ilha de Bagres, em San­tos, litoral de São Paulo. A agên­cia é responsável pela aprovação de projetos dessa natureza.

Lima foi encontrado por poli­ciais dormindo em uma casa que era usada como escritório por Mi­randa na Rua Alemanha, no Jar­dim Europa, bairro nobre de São Paulo. Ele confirmou que é ami­go do ex-senador e que foi convi­dado a se hospedar no imóvel porque os hotéis da cidade esta­vam lotados naquela semana, quando foi realizado o Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1.

Segundo a PF, "o fato de Tiago Pereira Lima ter sido encontra­do na casa do indiciado Gilberto Miranda Batista na data de defla­gração da operação policial" foi um dos indícios que fundamen­tou o pedido de indiciamento do ex-diretor da Antaq por corrup­ção passiva.

O então diretor da Antaq foi convidado pelos policiais a pres­tar esclarecimentos na sede da PF, mas telefonou para Miranda antes do depoimento, às 10043.

"Jantamos juntos, te conheço de quando senador, há 20 anos", afirma Miranda. "Isso", responde Lima. "Eu não tenho nada com o teu setor, eu não tenho absolutamen­te nada. Quando você foi indica­do pro teu cargo eu também não sabia", acrescenta o ex-senador "Sim", diz Tiago. No depoimento aos investigadores, Tiago Pereira Lima repete que havia jantado na véspera com Gilberto Miranda e que o conhece do Senado, desde mea­dos da década de 1990.

O ex-diretor da Antaq negou que tenha recebido qualquer vantagem financeira do ex-sena­dor e "que não tem conhecimen­to e não participou de qualquer pedido, gestão ou demanda de Gilberto Miranda" na agência.

Dois dias antes das prisões e apreensões feitas pela Polícia Fe­deral na Operação Porto Segu­ro, Lima foi flagrado em telefo­nemas para Gilberto Miranda, Paulo Vieira e César Floriano, apontados no inquérito como os articuladores de pareceres técnicos que beneficiariam empresas interessadas em operar portos.

"Bomba atômica". Horas de­pois do depoimento, às i6h20, Li­ma e Miranda voltam a conversar sobre a operação. Os dois tentam se afastar de Paulo Vieira, aponta­do como chefe da suposta quadri­lha que comprava pareceres.

"Agora, é aquele maluco, viu? Daquela bomba atômica", afirma Miranda, em referência a Paulo.

"E, eu já vi alguma coisa", res­ponde Tiago Pereira Lima.

"É tudo ele, tudo ele, viu? Ele está sendo monitorado há dois anos, hein? Ele é envolvido com cem pessoas", diz o ex-senador.

"Tem?", responde Lima.

"E não tem nada a ver com na­da. A gente não tem nada a ver de nada com ele", afirma Miranda".

"E fala bobagem, né? Besteira, né?", diz o ex-diretor da Antaq,

No inquérito da Operação Por­to Seguro, os investigadores da PF anotaram que, "como substi­tuto do diretor-geral da Antaq", Lima assinou um ofício que bene­ficiaria interesses de Gilberto Miranda e Paulo Vieira, "ceden­do a pedido ou influência dos mesmos e colocando-se à dispo­sição do grupo criminoso".

O criminalista Cláudio Pimen­tel, que defende o ex-senador Gilberto Miranda, disse que "não pretende, via imprensa, dis­cutir teses jurídicas porque não é o foro competente para isso", Pimentel observou. "(O ex-sena­dor) Irá se manifestar quando provocado para isso e no foro competente", em alusão à Justi­ça e à polícia. / F.m. e b.b.