Título: O Brasil para franceses
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/12/2012, Notas e informações, p. A3

Talvez por efeito do belo outono parisiense, os mi­nistros Guido Mantega, da Fa­zenda, e Fernan­do Pimentel, do Desenvolvi­mento, mostraram-se especial­mente inspirados em seus pro­nunciamentos na capital fran­cesa, onde participaram do Fó­rum pelo Progresso Social e de contatos com empresários lo­cais. Segundo Mantega, a crise externa retardou a recuperação da economia brasileira e impe­diu a indústria" de aumentar suas exportações, apesar do câmbio mais favorável do que era há um ano. Pimentel foi além e classificou como bom, diante do cenário internacio­nal, um crescimento econômi­co de i%. E acrescentou uma ressalva: esse número, apesar de bom, é inferior ao desejado. Deve ter sido um esclarecimen­to tranquilizador para quem pensa em investir no Brasil. No próximo ano, prometeram os ministros, o resultado será bem melhor, com expansão na faixa de 4% a 4,5%. Podem ter entusiasmado algum ouvinte menos familiarizado com os la­tino-americanos e outros paí­ses em desenvolvimento.

Aqueles mais informados so­bre o outro lado do Atlântico devem ter-se perguntado por que o Brasil cresce menos que os demais países sul-america­nos, exceto o Paraguai, prejudi­cado por grave seca. Terão es­ses países conseguido, por al­gum milagre, isolar-se do con­turbado mercado internacio­nal? Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Peru, Uruguai e Vene­zuela cresceram em 2011 a ta­xas entre 4,2% e 7,8%, enquan­to o Brasil só avançou 2,7%. O desempenho desse grupo é me­nos brilhante, em 2012, mas os resultados ainda ficam na faixa de 3,5% a 6% ou pouco mais, e as perspectivas de quase todos para 2013 são melhores que as do Brasil. Até em zonas mais próximas do núcleo da crise há países, como Estônia, Letônia e Turquia, com desempenho médio superior ao brasileiro.

A comparação com os demais emergentes é muito útil para a avaliação da política adotada no Brasil, dos resultados e das possi­bilidades de expansão econômi­ca a médio e a longo prazos. To­dos estão expostos às condições do mercado internacional - re­dução da demanda nas econo­mias mais avançadas, desacelera­ção na China e em outros gran­des emergentes, política monetá­ria expansionista nos EUA e na Europa e concorrência mais du­ra no comércio global.

Muitas economias emergen­tes e em desenvolvimento, no entanto, têm mantido um cres­cimento médio superior ao do Brasil, mais regular e com infla­ção menor. Surtos inflacioná­rios ocasionais têm sido contro­lados, na maior parte dos ca­sos, com razoável rapidez.

É difícil, portanto, levar a sé­rio os ministros brasileiros, quando atribuem o desempe­nho medíocre do País principal­mente às condições do merca­do externo. Quase sempre evi­tando detalhes, admitem al­guns problemas internos, mas prometem para breve o resulta­do das reformas iniciadas nos últimos tempos (em alguns ca­sos, mais prometidas do que iniciadas). "As medidas estão surtindo efeito", disse o minis­tro da Fazenda, embora mais lentamente, ressalvou, do que o governo desejava. O quarto trimestre, segundo ele, está sendo melhor que o terceiro e o País entrará em 2013 com a economia em aceleração.

O ouvinte mais atento deve ter percebido mais um detalhe inquietante: o ministro da Fa­zenda, assim como seus colegas, em gerai se abstém de discrimi­nar as medidas conjunturais e as políticas de maior alcance. Deixa pouco claras, portanto, as possibilidades de crescimento duradouro. O País pode crescer 4% ou mais em 2013. E depois?

A presidente Dilma Rousseff também andou inspirada. De­pois de mais uma vez ensinar aos europeus como vencer a crise, reafirmou sua confiança no futuro da economia brasilei­ra. O País, garantiu, será mais que um exportador de commo­dities, embora deva manter-se como potência alimentar e mi­neral. Mas o Brasil, antes das escolhas estratégicas do petismo, faturava bem mais com a exportação de manufaturados do que com a venda de primá­rios. A diplomacia comercial adotada a partir de 2003 e o desprezo às condições de com­petição mudaram esse quadro. A presidente, em seu arroubo parisiense, parece ter esqueci­do essa história.