Título: PF monitorou Vieira até a porta do Senado
Autor: Boghossian, Bruno ; Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/12/2012, Nacional, p. A8

A Polícia Federal monitorou Paulo Vieira, denunciado por corrupção ativa e outros qua­tro crimes na Operação Por­to Seguro, em uma visita que ele fez ao Senado no fim de outubro - menos de um mês antes de ser apontado como chefe de uma quadrilha que comprava pareceres técnicos de órgãos públicos para bene­ficiar empresas privadas.

O carro oficial usado por Viei­ra, que era diretor da Agência Na­cional de Águas (ANA), foi foto­grafado por mais de uma hora diante do Anexo 1 da Casa, onde ficam os gabinetes de pelo me­nos 16 parlamentares.

Um relatório de 19 páginas pro­duzido pelo Serviço de Opera­ções de Inteligência da PF foi re­produzido no inquérito da Porto Seguro. O material contém 25 fo­tos que ilustram a passagem de Vieira pelo Senado, no dia 30 de outubro, e seu encontro com ou­tros integrantes do grupo.

Agentes da PF registraram o momento em que Vieira deixou seu apartamento na Asa Sul, em Brasília, às 10h53 da manhã, no banco traseiro de um carro ofi­cial da ANA. Onze minutos de­pois, o veículo parou em frente à rampa de acesso ao Anexo 1 do Senado. Vieira saiu do carro e en­trou no prédio com um documen­to não identificado nas mãos. Ele ficou no local por 1h26min.

Os investigadores não ex­põem os motivos da ida de Vieira ao Senado, pois os agentes res­ponsáveis pelo monitoramento não entraram no prédio. O objeti­vo era evitar um mal-estar entre a corporação e o Congresso.

O Anexo 1 do Senado abriga gabinetes de 16 dos 81 parlamen­tares. Entre os ocupantes do pré­dio estão senadores do PSDB, do PT e o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) - que tem uma sala no 6.° andar.

Sarney é o único senador que aparece em um relatório da Ope­ração Porto Seguro que lista as autoridades com prerrogativa de foro mencionadas em diálo­gos e e-mails interceptados pela PF. Há oito páginas com citações a ele nesse material, que foi reme­tido ao Supremo Tribunal Fede­ral, à Procuradoria-Geral da Re­pública e ao Congresso.

Não há investigação aberta so­bre o possível envolvimento de Sarney com integrantes da organi­zação, mas o material compilado no curso da investigação indica uma proximidade entre o presi­dente do Senado e parte do grupo.

Sarney é próximo do ex-sena­dor Gilberto Miranda (PMDB- AM), denunciado por corrupção ativa e acusado de se beneficiar do esquema de compra de pare­ceres. Minutos depois de fazer a visita ao Senado em outubro, Vieira se encontrou com Miran­da em um shopping.

Vieira já havia conseguido o apoio de Sarney a sua nomeação para a ANA, em 2010. Seu nome foi rejeitado no Senado, mas uma manobra do presidente da Casa permitiu uma nova votação.

O delator do esquema, Cyonil Borges, também afirmou à PF que Vieira pediria à Sarney que interferisse na tramitação de um processo do Tribunal de Contas da União para beneficiar empre­sas ligadas ao grupo.

O defensor de Vieira, o advoga­do Michel Darré, não foi encon­trado para comentar o monitora­mento da PF e a visita de seu cliente ao Senado.

A assessoria de Sarney afir­mou que Vieira só visitou o presi­dente do Senado quando busca­va apoio para sua indicação para a ANA. "Habitualmente, indica­dos para cargos que necessitem de aprovação do Senado, antes da sabatina, visitam senadores, presidentes de Comissão e o pre­sidente da Casa. Apenas nessa circunstância - e naquela oca­sião-o senhor Paulo Vieira este­ve na presidência do Senado."

O presidente do Senado afir­mou ainda que as declarações de Cyonil sobre uma suposta inter­ferência em um processo do TCU são "inverídicas".