Título: Lei eleitoral do Equador retira oposição da mídia
Autor: Russo, Guilherme
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/12/2012, Internacional, p. A18

A dois meses da votação em que

O presidente Equador, Rafael Correa, tentará a reeleição, ana­listas políticos do país descre­vem um cenário eleitoral com uma oposição fragmentada e pra­ticamente desconhecida. A au­sência dos opositores do noticiá­rio é atribuída à lei que, desde fevereiro, prevê punições a meios de comunicação que expu­serem posições pró ou contra qualquer concorrente das dispu­tas eleitorais ou proposições em referendo.

Especialistas não confiam nas pesquisas, que dão cerca de 60% das intenções de voto ao presi­dente equatoriano e 20% a Guillermo Lasso, opositor mais bem colocado. E afirmam que a falta de precisão dos números, assim como a falta de cobertura dos candidatos contrários a Correa - sete, no total -, é em razão do ambiente de “controle” decor­rente da nova legislação e das constantes críticas que ele faz contra qualquer um que discor­de de suas posições ou atitudes.

Segundo o levantamento da ONG Fundamedios, o líder usou a cadeia nacional de rádio e TV em cerca de 1,5 mil ocasiões - em que insistentemente denuncia e ofende jornalistas críticos ao seu governo - desde que assu­miu, em 2007. De acordo com a entidade, desde 2008, 595 agres­sões contra jornalistas foram re­gistradas no país. O diretor exe­cutivo da Fundamedios, César Ricaurte, atribui as ocorrências à “perseguição constante” que o presidente exerce contra os pro­fissionais de imprensa e à políti­ca de controle da mídia em seu país.

O especialista em política e economia equatoriano Walter Spurrier, diretor da publicação online Análise Semanal, afirma que a chamada Lei Orgânica Eleitoral, Código da Democracia não deixa claro os limites que impõe à cobertura das campanhas e, por isso, os meios de comuni­cação estão se autocensurando para evitar as multas, “de US$ 50 mil a US$ 100 mil”, previstas pe­la legislação - e evitam noticiar as ações dos candidatos.

O cientista político Simón Pachano, da Faculdade Latino- Americana de Ciências Sociais (Flacso), do Equador, afirmou que “Correa tem fechado os es­paços para a crítica”, explicando tanto a ausência de seus oposito­res na mídia quanto a falta de confiança dos analistas nos nú­meros das pesquisas eleitorais no país. “Não se sabe o que os demais candidatos estão propon­do e não há claridade em suas propostas”, afirmou.

Ambos os especialistas con­cordam que o presidente aposta­rá todas as suas fichas em uma reeleição no primeiro turno, pa­ra que a oposição não possa se unir em torno de um candidato comum.

“Não tenho acesso a números reais de pesquisas, mas é eviden­te que Correa apresenta uma vantagem e há uma grande pro­babilidade de que ele vença no primeiro turno”, disse Spurrier, lembrando que, no Equador, 40% dos votos válidos são sufi­cientes para eleger um candidato a presidente, caso o segundo colocado obtenha menos de 30%. Para o analista, Correa teria justamente 40% das intenções e Lasso, seu concorrente mais bem colocado, “mais de 20%, porém menos de 30%”.

“Esse clima de controle faz com que as pessoas escondam sua intenção, se elas não estão de acordo com o presidente”, disse Pachano, lembrando que, antes de Correa chegar ao poder, pes­quisas de opinião realizadas já apresentaram erros de até 20% em relação ao resultado oficial anunciado após as votações.

Sanções. No início de outubro, o Tribunal Contencioso Eleito­ral, que julga os casos de violação à lei que controla a imprensa nas proximidades de eleições, con­denou a revista Vistazo ao paga­mento de US$ 80 mil em razão da publicação de um editorial, do dia 6 de maio de 2011, que pe­dia que os leitores votassem con­tra duas questões de um referen­do realizado no Equador no dia seguinte.

Em fevereiro, o jornal El Uni­verso, um dos maiores do Equa­dor, seus três diretores e o então editor de opinião do diário, Emilio Palacio, foram condenados a 3 anos de prisão e a pagar US$ 40 milhões de indenização ao presi­dente, acusados de injúria em ra­zão de um editorial que Correa considerou ofensivo {mais infor­mações nesta página).

Durante o processo, em agos­to de 2011, Palacio fugiu para os EUA, onde obteve asilo político um ano depois. Segundo o jorna­lista, porém, seus problemas com o presidente começaram , quando Correa aindá era minis­tro das Finanças, em 2005, tam­bém em razão de um artigo de opinião que ele havia publicado. “A perseguição foi constante des­de então”, disse, de Miami, onde vive atualmente.

Palacio afirmou que fugiu do país porque, após deixar o Uni­verso, obteve um vídeo em que Correa chamava, em 30 de outu­bro de 2010, policiais que faziam uma greve no Equador de “trai­dores da pátria”, pouco antes de discursar para os manifestantes. Segundo o jornalista, o presiden­te exigiu na Justiça que ele reve­lasse a fonte de sua informação. Palacio afirmou que, por não es­tar mais vinculado ao jornal, te­mia ser obrigado a fazê-lo. “Por isso fugi. Foi a gota d"água.”