Título: Pela Constituição, Congresso é quem decide sobre cassações
Autor: Peron, Isadora
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/11/2012, Nacional, p. A10

Assembleia Nacional Constituinte decidiu que mandatos só podem ser cassados pelos plenários da Câmara e do Senado.

A polêmica que o Supremo Tribunal Federal agora enfrenta sobre a cassação dos mandatos dos parlamentares condenados no processo do mensalão nunca existiu entre aqueles que escreveram a Constituição de 1988. No dia 18 de março de 1988, uma sexta-feira, por 407 votos favoráveis contra 16 contrários e 6 abstenções, a Assembleia Nacional Constituinte decidiu que parlamentares condenados criminalmente só podem ser cassados pelos plenários da Câmara ou do Senado.

De olho no passado, lembrando o histórico de interferências políticas dos governos militares no Supremo, os constituintes discutiram se deputados e senadores condenados pelo tribunal perderiam automaticamente o mandato. E, naquele momento, os parlamentares só podiam ser processados na Suprema Corte após autorização da Câmara ou do Senado.

O texto apresentado pelo chamado "Centrão" (grupo majoritário na Constituinte, com parlamentares ligados ao centro no espectro ideológico) previa, como agora defendem alguns ministros da Corte, a cassação automática do mandato dos parlamentares quando houver condenação irrecorrível do STF. Caberia às mesas da Câmara e do Senado apenas reconhecer e homologar a decisão do Supremo.

É exatamente esta tese que defendem alguns ministros do Supremo. Por esse entendimento, o tribunal poderia, na definição das penas, já determinar a perda de mandato dos deputados Valdemar Costa Neto (PR-SP), João Paulo Cunha (PT-SP) e Pedro Henry (PP-MT), condenados no processo do mensalão.

O mesmo valeria para o ex-presidente do PT José Genoino (SP), também condenado pelo Supremo, que deve assumir o mandato com as vagas abertas em razão da saída de deputados para comandarem prefeituras no ano que vem.

Mudança. Entretanto, uma emenda apresentada pelo constituinte Antero de Barros e destacada por Fernando Lyra alterou a regra. Coube ao então constituinte Nelson Jobim, que presidiu o Supremo Tribunal Federal de 2004 a 2006, defender a mudança e a correção do que ele classificou como um erro.

Se não houvesse a mudança, argumentou Jobim, o Congresso poderia se deparar com situações esdrúxulas. "Neste caso, teríamos a seguinte hipótese absurda: um deputado ou um senador que viesse a ser condenado por acidente de trânsito teria imediatamente, como consequência da condenação, a perda do seu mandato, porque a perda do mandato é pena acessória à condenação criminal", argumentou Jobim na época.

A emenda visava, de acordo com ele, a deixar para o plenário da Câmara ou do Senado a perda do mandato do parlamentar condenado pelo tribunal. "Deste modo, tratar-se-ia de decisão política a ser tomada pelo plenário de cada uma das casas na hipótese de condenação judicial de um parlamentar, e não teríamos uma imediatez entre a condenação e a perda do mandato, em face da competência que está contida no projeto", disse Jobim.

Apesar de estar na origem da Constituição, a discussão será retomada pelos ministros do Supremo no fim do julgamento do mensalão. Parte dos ministros afirma que, se o tribunal determinar a perda de mandato, o Congresso não terá outra opção senão cassar os deputados. Outros ministros afirmam que a Constituição é clara e defenderão a tese de que caberá ao plenário da Câmara decidir se os mandatos dos parlamentares serão ou não cassados.