Título: Mais de 3 mil inquéritos da PF apuram desvio de verba pública em prefeituras
Autor: Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/12/2012, Nacional, p. A4

A Polícia Federal conduz 3.167 inquéritos sobre desvios de recursos e corrupção envolvendo prefeituras em todo o País. Estão sob investigação 484 prefeitos e ex-prefeitos por violação ao Decreto Lei 201/67, que define os ilícitos de responsabilidade de administradores municipais.

Os dados constam de levantamento realizado pela Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado (Dicor) braço da PF que aloja setores estratégicos da instituição, inclusive o serviço de análise de dados de inteligência e a divisão de repressão a crimes financeiros.

O Maranhão é o Estado onde a PF mais trabalha, com um acervo de 644 inquéritos relativos a fraudes em gestões municipais. A Bahia está em segundo lugar, com 490 inquéritos, seguida de Ceará (296), Piauí (285), Pará (196) e Pernambuco (194).

"Certamente esses Estados, por serem mais carentes, com IDH (.índice de Desenvolvimento Humano) muito baixo, acabam recebendo mais recursos da União, verba vinculada, e aí, obviamente, nessas regiões pode ocorrer mais desvios", disse o delegado Oslain Campos Santana, chefe da Dicor. Em São Paulo, são 96 os inquéritos sobre gestores que atropelaram a lei; em Alagoas, 83; e no Rio de Janeiro, 60.

Além de prefeitos e ex-prefeitos, são investigados 182 servidores municipais, 87 secretários municipais e 63 funcionários que ocupam cargos de comissão.

Esses dados são relativos apenas à atuação da PF centenas de outros prefeitos e ex-prefeitos são réus em demandas movidas pelo Ministério Público nos Estados, que detém competência para propor ações com base na Lei da Improbidade.

Conluio. Oslain Santana é um policial tarimbado. Já passou por setores sensíveis da corporação e lugares remotos do País desde que ingressou na PF, há 17 anos. Ao analisar as informações relativas aos malfeitos das prefeituras, ele faz uma ponderação. "Muitas vezes pode ser que não tenha crime de prefeito ou envolvimento do ordenador de despesa. Pode ter havido um conluio entre empresários que formam cartel para fraudar licitação." Ele observa que, com tantos inquéritos, a polícia acaba contrariando interesses. "Não temos partido. A corrupção é própria do ser humano. As instituições são boas, os homens não são tão bons assim."

O mapeamento abrange ainda os inquéritos sobre crimes de violação à Lei 8.666/93 (licitações) e contra a administração pública peculato, concussão (extorsão por servidor público), corrupção passiva e ativa, tráfico de influência e inserção de dados falsos nos programas de informação. Esses inquéritos estão aparte das investigações referentes exclusivamente às administrações municipais.

Tais ilícitos são praticados com recursos da União em todos os níveis da administração municipal, estadual e federal, e todos os Poderes, que somam 8,1 mil inquéritos, ou 10% do volume de vestigados nesse bloco 384 servidores públicos federais da administração direta e indireta e 1.633 agentes públicos municipais.

Por fraude à Lei de Licitacões a PF mantém em curso 1.958 inquéritos. Peculato (quando o funcionário público desvia bens da administração) é alvo de 944 inquéritos, seguido da cor­rupção passiva (504), ativa (94) e concussão (145).

Em valores globais, todos os contratos sob apuração das prefeituras e os dos demais órgãos de governo somam R$ 651 bilhões. Não quer dizer que esse seja o montante desvia­do, é bom que fique claro. O va­lor se refere aos contratos que estão sob investigação", assina­: Oslain.

Especificamente com relação às prefeituras, a PF usa como instrumento legal para enquadrar gestores à margem do decoro o Decreto Lei 201, que dispõe so­bre a responsabilidade dos pre­feitos e vereadores e prevê 23 si­tuações que provocam danos ao erário apropriação de bens ou rendas públicas, desvios em pro­veito próprio ou alheio, deixar de prestar contas anuais, orde­nar ou efetuar despesas não auto­rizadas por leis, fraudes à licita­ção, e outros. A sanção vai de 2 anos a 12 anos de prisão.

"São elevadíssimos os recur­sos que a União repassa para os municípios, principalmente atra­vés de convênios nas áreas de educação e saúde", diz Oslain. O delegado lembra que a PF não atua isoladamente. Grande par­cela dos inquéritos instaurados tem base em auditorias da Con- troladoria-Geral e do Tribunal de Contas da União.

Para dar conta desse expe­diente tão excepcional, a direção-geral da PF criou as delega­cias e setores de combate a ilíci­tos financeiros e ao crime orga­nizado em todas as superinten dências regionais. "O governo, via Ministério da Justiça, atendeu a um compromisso do qual ; o Brasil é signatário, a Convenção de Mérida (México), para combate à corrupção."