Título: Mais confusões com o Enem
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Fonte: O Estado de São Paulo, 04/01/2013, Notas e informações, p. A3

O Exame Nacio­nal do Ensino Médio (Enem) de 2012 voltou a apresentar problemas. Des­de que suas notas passaram a ser utilizadas como critério de seleção pelas universidades fe­derais, essa tem sido a sina do Enem, que originariamente era um eficiente mecanismo de avaliação de um ciclo escolar.

Desta vez, os problemas do Enem surgiram com a prova de redação. O tema - a imigração para o Brasil no século 21- foi considerado difícil pelos alu­nos e classificado como com­plexo e inesperado pelos pro­fessores. "O tema está fora do eixo da maioria dos estudan­tes", diz Rogério Chociay, pro­fessor do curso de Letras da Unesp e especialista em reda­ção de vestibular.

Para corrigir a redação, o Ins­tituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) - o órgão responsável pelo Enem - contratou 5.683 profis­sionais - cerca de 40% a mais do que o número de corretores que trabalharam na prova de 2011. E, para assegurar unifor­midade e coerência nos crité­rios de correção, o Inep os sub­meteu a duas sessões de treina­mento - o que era insuficiente.

No Enem, a nota da redação varia de zero a mil. Até 2011, as provas sofriam duas correções. Quando havia uma diferença de mais de 300 pontos entre uma e outra correção, a reda­ção era submetida a uma tercei­ra leitura. Na prova de 2012, a diferença caiu para 200 pon­tos. Com isso, o número de re­dações que tiveram de passar por um terceiro avaliador foi duas vezes maior que o registra­do na edição em 2011. Dos 4.113.558 textos corrigidos, 826.798 foram examinados por um terceiro corretor. É um nú­mero muito alto.

Além disso, quando a nota dada pelo terceiro corretor fica muito além ou muito aquém da média das notas dadas pelos dois primeiros corretores, a prova é submetida a uma banca especial integrada por três es­pecialistas. Ao todo, 100.087 textos tiveram de ser avaliados por essa banca. Para o Inep, os números ficaram dentro do pre­visto nas simulações realizadas pelos técnicos que prepararam o Enem de 2012. Mas os alunos que se submeteram ao exame reclamam, com razão, da falta de objetividade e transparência nas correções. Também ale­gam que as notas dadas à reda­ção não são compatíveis com as notas que esperavam. Estu­dantes que obtiveram 800 na redação, em 2011, por exemplo, tiraram notas inferiores a 500, na prova do ano passado.

Por isso, 9,4 mil estudantes se articularam por meio de re­des sociais para pressionar o MEC para acolher pedidos de revisão de nota, depois de per­mitir acesso às provas corrigi­das. Em 13 capitais, foram reali­zadas passeatas e um grupo de protesto foi criado por 27 mil estudantes no Facebook.

As autoridades educacionais alegam que o edital do Enem de 2012 não prevê a possibilida­de de revisão de nota da reda­ção. Também afirmam que a al­teração das notas é inviável, uma vez que as inscrições no Sistema de Seleção Unificada - pelo qual serão preenchidas 129 mil vagas em instituições públicas de ensino superior - começam no dia 7.

Mas, em cinco Estados, os es­tudantes acionaram o Ministé­rio Público Federal para assegu­rar o direito de vista da prova da redação. "Em todo concurso público é sagrado o direito de revisão", diz Oscar Costa Filho - o mesmo procurador que pe­diu a anulação do Enem, no ano passado. E, no Rio de Janeiro, a primeira instância da Justiça Fe­deral concedeu liminar a uma estudante fluminense que invo­cou o direito a uma "vista peda­gógica", dando ao Inep o prazo de 48 horas para apresentar a prova devidamente corrigida. A liminar também deu à estudan­te o prazo de 24 horas, contado a partir do recebimento da pro­va, para pedir a revisão da corre­ção e solicitar parecer circuns­tanciado dos corretores.

Em 2011, por não ter respeita­do direitos previstos pela Cons­tituição, o MEC teve de firmar com o Ministério Público um Termo de Ajustamento de Con­duta, para que os candidatos ti­vessem acesso à correção do Enem. Os problemas ocorridos naquele ano poderiam ter sido evitados em 2012, caso as auto­ridades educacionais fossem mais eficientes e o Enem não ti­vesse sido desfigurado, como mecanismo de avaliação.

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