Título: Como fica o FPE? Ou não fica?
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/12/2012, Notas e informações, p. A3

Em descanso que por certo conside­ram merecido, ape­sar do muito que deixaram de fazer por desídia ou con­veniência, deputa­dos e senadores talvez nem se lembrem de que, por não terem decidido a tempo, criaram um imenso problema jurídico cuja con­sequência pode ser o caos nas finan­ças dos Estados, ameaçados de não receber, em 2013, transferências de mais de R$50 bilhões. Por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), tomada em fevereiro de 2010, as regras aplicadas até agora para o cálculo da parcela do Fundo de Participação dos Estados (FPE) a que cada Estado tem direito não va­lem mais depois de 31 de dezembro de 2012.

Para evitar a suspensão das trans­ferências após essa data, o Congres­so deveria ter aprovado novas regras para a repartição. Dispôs de praticamente três anos para tomar essa de­cisão, mas nada fez. E, enquanto seus membros, incluindo os dirigen­tes das duas Mesas, descansam jun­to aos seus e aos seus eleitores, cida­dãos responsáveis se perguntam: o que acontecerá?

A não definição de novas regras para a repartição do FPE é mais uma demonstração clara do modo como o Congresso adia decisões - mesmo com o risco de levar a um vazio jurí­dico, como agora - sobre questões que sejam um pouco mais comple­xas, como as que envolvem interes­ses conflitantes das Unidades da Fe­deração. Ressalve-se, em favor dos atuais congressistas, que este não é um problema só desta legislatura, pois ele deveria ter sido resolvido, no máximo, dois anos depois da pro­mulgação da Constituição de 1988, Criado em 1965, o FPE foi incorporado à Constituição. Sua aplicação foi regulada pela Lei Complementar n.° 62, de dezembro de 1989, mas a própria lei estabeleceu que os crité­rios para a divisão do FPE eram pro­visórios e deveriam ser substituídos em 1991, por regras baseadas nos da­dos do Censo Demográfico de 1990. Mudou o País, mudaram as necessi­dades de cada Estado por recursos transferidos pelo governo federal, mas, mais de 20 anos depois do tér­mino de seu prazo de validade, as re­gras do FPE continuam as mesmas.

Governos de Estados que se senti­ram prejudicados pelas regras atuais entraram com Ações Diretas de Inconstitucionalidade contra a lei com­plementar de 1989. No julgamento dessas ações, o STF declarou incons­titucional o artigo da lei que define as regras de reparticipação do FPE e deu ao Congresso prazo de quase três anos para estabelecer novas. Es­perava-se que, com essa decisão, o Congresso, afinal, aprovasse novos critérios. Sobre o assunto, há proje­tos tramitando nas duas Casas, mas que, por conveniência política dos parlamentares, não avançaram.

A consequência óbvia seria a sus­pensão das transferências depois de terminado o prazo dado pelo STF pa­ra o Congresso decidir. As implica­ções práticas da suspensão, no en­tanto, seriam imensas - o FPE repre­senta mais da metade da receita de alguns Estados, e na de vários ou­tros tem participação elevada.

Chega a ser comovente a singele­za com que o secretário do Tesou­ro Nacional, Arno Augustin, ava­liou a situação. "Não vejo como os Estados podem ficar sem esses re­cursos", disse. "Alguma coisa de­ver ser feita." De fato, deve - mas não será feita pelo Executivo, co­mo ressalvou Augustin.

Então, 0 que fazer? E quem fará? O STF precisa ser provocado para to­mar qualquer decisão. E, se nova de­cisão houver, não poderá, na essên­cia, ser diferente da que tomou em 2010, limitando-se a ampliar o prazo.

É com isso que conta o relator do projeto sobre o FPE que tramita no Senado, senador Walter Pinheiro (PT-BA), ao prever que no reinicio dos trabalhos legislativos, em feve­reiro, o Congresso poderá iniciar entendimentos sobre o assunto com o Supremo.

Até lá, políticos da base governista e da oposição que se preocupam com o assunto esperam que prevale­ça o entendimento do Tribunal de Contas da (TCU) de que, co­mo vem sendo feito, deve-se fazer o rateio dos recursos de acordo com os coeficientes utilizados até agora, e que são fornecidos pelo próprio TCU. Talvez meia solução dei­xe em paz com suas consciências os congressistas preocupados com o te­ma. Para os demais, tanto faz.