Título: Renan turbina Minha Casa em alagoas e empreiteira amiga fatura R$ 70 mi
Autor: Rizzo, Alana
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/01/2013, Nacional, p. A4

A combinação de influência na Caixa Econômica Federal (CEF) e o comando político de 80% dos municípios fez do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), favorito para as­sumir o controle do Senado, o "midas" do Minha Casa, Mi­nha Vida em Alagoas com pelo menos um resultado notável: a Construtora Uchôa, do ir­mão de Tito Uchôa, apontado como laranja do peemedebista, faturou mais de R$ 70 mi­lhões no programa nos últi­mos dois anos.

Empresário versátil, Tito Uchôa é sócio do filho do sena­dor, o deputado federal Renan Filho (PMDB), em uma gráfica e em duas rádios. Também é pro­prietário de uma agência de via­gens, uma empresa de locação de carros e um supermercado. A mulher dele, Vânia Uchôa, era funcionária do gabinete do sena­dor Renan Calheiros.

Uma engenharia financeira pe­culiar do programa Minha Casa, Minha Vida valoriza os atributos do candidato à Presidência do Se­nado e abre espaço para a inge­rência política. As contratações - sem processo de licitação - são feitas diretamente pela Caixa, área de influência de Renan e do PMDB no Estado, a partir de pro­postas apresentadas por prefei­tos e empreiteiras ao banco.

Das 26 prefeituras de Alagoas incluídas no programa, apenas duas não são comandadas por aliados de Renan. O peemedebista garante ter nas mãos 80% dos 102 municípios alagoanos. "Ele­gemos diretamente 25 prefeitos em todas as regiões e em aliança com os partidos coligados ganha­mos em mais de 80% dos municí­pios", vangloriou-se Renan, em convenção do PMDB em dezem­bro passado.

O programa de moradias po­pulares é uma das principais ban­deiras da presidente Dilma Rousseff. O Minha Casa, Minha Vida é uma das armas do senador para aumentar seu capital político nas próximas eleições.

Alagoas está, proporcional­mente, entre os maiores contra­tantes do Minha Casa, superan­do outros Estados do Nordeste e até a meta do próprio governo, que era construir 13 mil unida­des no Estado.

Hoje, mais de 26,8 mil unida­des habitacionais já foram con­tratadas e o volume de recursos públicos investido ultrapassa a marca de R$ 1 bilhão. Para se ter ideia, Sergipe, administrada pe­lo petista Marcelo Déda, com perfil populacional e área seme­lhantes aos de Alagoas, registra R$ 200 milhões em contratos.

Terra natal. A Uchôa assinou seu primeiro contrato do Minha Casa, Minha Vida em dezembro de 2010 para a construção de 1.261 casas populares em Santa­na do Mundaú. O município, a 30 quilômetros de Murici, terra de Renan Calheiros, foi atingido pelas chuvas naquele ano e ficou parcialmente destruído.

A operação, no valor de R$ 51,7 milhões, utiliza recursos do Mi­nistério das Cidades e é coorde­nada pela Caixa. No Orçamento de 2011, Renan apresentou emen­da ao ministério no valor de R$ 4,2 milhões para obras de infraestrutura e habitação popular.

A construtora Uchôa, no en­tanto, ainda não entregou as ca­sas previstas no contrato. Segun­do o prefeito da cidade, Marcelo Souza (PSC), a empreiteira atra­sou a entrega das moradias. "Era para ficar pronto no ano passa­do. As pessoas continuam mo­rando de aluguel ou na casa de algum parente porque elas per­deram tudo na chuva. Essa obra é muito importante."

Agora a empreiteira está negociando na Caixa e no Ministério das Cidades um aditivo de R$ 5 milhões para terminar as obras no conjunto habitacional.

Este ano, a Uchôa conseguiu fechar seu segundo contrato. Cerca de R$ 20 milhões serão destinados à construção de 400 unidades habitacionais em Cam­po Alegre. O novo contrato colo­ca a Uchôa no rol de grandes be­neficiárias do Minha Casa, Mi­nha Vida no Estado.

Contraste. Dados do Portal da Transparência do governo fede­ral mostram que a empreiteira não tinha tradição em grandes obras públicas com recursos da União. Em 2011, a Uchôa rece­beu R$ 217 mil do governo fede­ral para a reforma em prédios mi­litares. Em 2010, R$ 513 mil para o mesmo objetivo.

Proprietário da Uchôa, Jubson Uchôa Lopes não quis co­mentar a relação da família com Renan e nem com seus negócios. "Você quer saber do Minha Ca­sa, Minha Vida, do meu irmão ou do Renan, que está disputando a presidência do Senado?" O em­presário desligou o telefone e não retornou as ligações feitas pela reportagem.

Seu irmão, Tito Uchôa, é apon­tado como um testa de ferro de Renan em Alagoas.

Além do vínculo pessoal com Renan Calheiros, Tito integra a diretoria do PMDB de Alagoas, presidida pelo senador. Ele já foi apontado como responsável por fazer negócios ocultos para o se­nador, como a compra de imó­veis e rádios no Estado.

Improbidade. Tito também foi acusado pêlo Ministério Público Federal de improbidade admi­nistrativa e de favorecer a cons­trutora do irmão com contratos públicos na época em que che­fiou a Delegacia Regional do Tra­balho (DRT).

O Estado não conseguiu falar com Tito Uchôa. A reportagem deixou recados na sede do PMDB, mas ele não respondeu às ligações. O senador Renan Calheiros também não respondeu às ligações e nem aos questiona­mentos enviados por e-mail pa­ra sua assessoria.