Título: OEA inicia investigação do caso Vladimir Herzog
Autor: Arruda, Roldão
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/01/2013, Nacional, p. A9

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da Organi­zação dos Estados America­nos, admitiu oficialmente a in­vestigação do caso do jornalis­ta Vladimir Herzog, assassina­do em 1975, durante a ditadura militar. A decisão, tomada inter­namente em novembro e divul­gada ontem por familiares de Herzog, abre caminho para se investigar as responsabilidade do Estado brasileiro no caso.

O pedido de investigação tra­mita na OEA desde 2009. No ano passado, o govemo brasilei­ro foi consultado pela institui­ção e tentou obstruir o processo. Mas os seus argumentos foram rejeitados, segundo Viviana Krsticevic, diretora executiva do Centro pela Justiça e o Direito Internacional, uma das três orga­nizações de direitos humanos que, ao lado dos familiares, assi­naram a petição à comissão.

"Já não existem empecilhos formais para estabelecer respon­sabilidades em relação ao caso de tortura e morte do jornalis­ta", disse Viviana. "O caso foi aceito porque, até o momento, o Estado não cumpriu seu dever de sancionar os responsáveis."

O govemo alegou que é impos­sível punir os responsáveis por causa da Lei da Anistia de 1979, que teria beneficiado também agentes de Estado acusados de violações de direitos humanos. "A Comissão segue a jurispru­dência da Corte Interamericana, que estabelece que são inadmis­síveis disposições de anistia des­tinadas a impedir a investigação e a punição dos responsáveis por violações de direitos humanos, como a tortura,execuções sumá­rias, prisões e desaparecimentos forçados", disse Viviana.

O engenheiro Ivo Herzog, filho do jornalista assassinado e presidente do instituto que leva o nome do pai, disse que ele e sua família querem saber quem foram os responsáveis. "Essa decisão da comissão não favorece só minha família. Beneficia muitas famílias que vivem situações semelhantes", afirmou.

Informes. Nos próximos dias, as organizações peticionárias enviarão novos informes à OEA sobre o caso. No final, de acordo com os procedimentos normais, não haverá nenhuma responsabilização de pessoas. Mas poderão ser cobradas providências do Estado brasileiro para a melhoria de suas instituições e garantia de que se faça Justiça. Segundo Viviana, um dos alvos principais da análise é o Judiciário.

"A decisão da comissão é uma mensagem clara de que os casos não podem seguir impunes, tendo em vista os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil", acrescentou Viviana.

Se o País não cumprir as sugestões da Comissão, o caso poderá ir à Corte Interamericana, que tem poder para determinar sanções no âmbito internacional.

Herzog era jornalista da TV Cultura e membro do clandesti­no Partido Comunista Brasilei­ro (PCB). Foi torturado e morto nas dependências do DOI-Codi do 2º Exército, em São Paulo, na manhã do dia 25 de outubro.

Segundo as autoridades milita­res, ele cometeu suicídio. Essa versão já foi desmontada na Jus­tiça, por meio de ação declaratória, mas todas as tentativas de apurar as responsabilidades fo­ram rechaçadas pelo Judiciário, com base na Lei da Anistia.

Em 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) referendou a in­terpretação de que a Lei benefi­ciou os agentes de Estado.