Título: Elefante branco
Autor: Kramer, Dora
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/02/2013, Nacional, p. A6

Nnca tantos ficaram tão acabrunhados nas eleições para as presidências da Câ­mara e do Senado.

Constrangimento insuficiente pa­ra gerar reação em prol de um Poder Legislativo melhor, mas um descon­forto evidente resumido na frase pre­cisa do deputado Chico Alencar: "O Parlamento está mal". Nem no PMDB o clima é de regozijo com o acúmulo de tanto poder: as presidên­cias das duas Casas e a Vice-Presidência da República.

O partido gosta da posição, é cla­ro, mas há muita gente ali perceben­do que talvez não valha a pena o pre­ço de ter um presidente do Senado com extenso telhado de vidro e um pre-sidente da Câmara que nem de longe pode representar alguma expectativa de novos ares.

Os adversários Rose de Freitas (47 vo­tos), Julio Delgado (165) e Chico Alen­car (11) dedicaram um bom tempo de seus discursos às razões que rebaixam o Congresso na escala das instituições avaliadas em pesquisas de opinião.

Já o vitorioso Henrique Eduardo Al­ves (271 votos) fez de conta que o mar está para peixe. Reconheceu um erro aqui, outro ali - omissão no exame dos vetos presidenciais e nas regras para distribuição do Fundo de Participação dos Estados.

Preferiu falar de questões internas: distribuição mais igualitária de relatorias, obrigatoriedade na liberação de re­cursos de emendas individuais ao Orça­mento e, em homenagem ao corporati­vismo explícito, propor uma TV Câmara "menos TV e mais Câmara", que dei­xe de lado evidências como plenário va­zio e se dedique a divulgar as andanças dos deputados em seus Estados.

A ética celebrada ontem foi aquela da palavra firme dos partidos no cumpri­mento dos acertos entre bancadas.

Pronunciamento que torna a vitória autoexplicativa e não autoriza nenhu­ma esperança de que o Congresso con­siga ao menos em breve, apesar do acen­tuado desconforto com a situação, reu­nir forças para enfrentar temas que po­deriam ajudar na recuperação da credi­bilidade da instituição.

Três exemplos: fim dos 14º e 15º salá­rios, fim do voto secreto para cassação de mandatos (propostas já aprovadas pelo Senado) e uma reforma política que reformule de verdade os meios e modos da relação entre representantes e representados.

A julgar pelos balanços das respectivas gestões feitos nas despedidas do senador José Sarney e do deputado Marco Maia, o Congresso tem atuado com extraordiná­ria eficiência e decência. Ambos atribuí­ram a crescente opinião negativa do públi­co em relação ao Parlamento a "injustiças e incompreensões" resultantes da "trans­parência" do Poder Legislativo.

O tipo do autoengano que não enga­na ninguém e, sobretudo, não devolve a estatura que deveria ter o ambiente on­de se reúnem as pessoas eleitas para legislar, fiscalizar os atos do Executivo, debater os problemas nacionais.

Em suas despedidas Sarney e Maia saudaram enfaticamente os avanços tecnológicos ocorridos na Câmara e no Senado, sentindo-se, por isso, mo­dernos e dignos de elogios.

Quanto a práticas que fazem a polí­tica brasileira permanecer atolada no atraso, não há informatização que dê jeito nem evite que a atual sessão legislativa comece velha, desgastada e, a despeito da desfaçatez da maio­ria, faça do Legislativo um poder combalido, envergonhado de si.

E nisso está coberto de razão.

Mão do gato» Nem bem assumiu a presidência do Senado, na sexta-fei­ra, Renan Calheiros deixou de lado a discrição e tentou influir na escolha do líder do PMDB na Câmara.

Juntou-se a Jader Barbalho e José Sarney para trabalhar por Sandro Mabel - que acabou perdendo para Eduardo Cunha - e conseguiu virar votos no Maranhão e no Pará, redu­zindo a votação de Cunha.

A ofensiva aumentou a tensão na bancada, expressa no resultado apertado, 46 votos a 32, de um PMDB onde começa de novo a se corroer a unidade interna já na pers­pectiva de 2014.