Título: Fala de Mantega derruba dólar, mas Banco Central intervém e cotação sobe
Autor: Modé, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/02/2013, Economia, p. B1

Declarações de autoridades da área econômica voltaram a confundir o mercado de câm­bio do País e obrigaram o Ban­co Central (BC) a fazer uma in­tervenção para evitar que o dó­lar caísse abaixo de R$ 1,95 on­tem. Ao final dos negócios, a moeda americana fechou está­vel, cotada a R$ 1,972.

Em entrevista à agência Reuters, o. ministro da Fazenda, Guido. Mantega, afirmou que o go­verno não permitirá que o dólar caia abaixo de R$ 1,85. "Se hou­ver de novo uma tendência espe­culativa, se o pessoal se animar: "Vamos puxar esse câmbio para 1,85", aí estaremos de novo inter­vindo", disse o ministro.

Operadores entenderam o re­cado como uma senha de que o governo estaria interessado em que o real se valorizasse ainda mais para ajudar a conter a alta da inflação neste início de 2013. O IPCA, que serve de referência para a meta, atingiu 6,15% nos 12 meses encerrados em janeiro, perto do teto de 6,50%.

"O discurso novamente foi confuso. O ministro Mantega, até há pouco tempo, defendia um câmbio em R$ 2. Agora fala em R$ 1,85", comentou João Pau­lo de Gracia Corrêa, gerente de câmbio da Correparti Correto­ra, de Curitiba. "Mais uma vez, o governo confundiu o mercado", emendou o diretor de câmbio do Banco Paulista, Tarcísio Rodri­gues Joaquim.

Nesse clima, o dólar derreteu logo na abertura dos negócios, chegando perto de R$ 1,95. O BC, então, realizou um leilão do cha­mado swap cambial reverso, que, na prática, equivale à com­pra de moeda americana.

Rodrigues Joaquim e outros especialistas explicam que o go­verno tem hoje enorme peso no mercado cambial. Por duas ra­zões. A primeira é o tamanho das reservas internacionais brasilei­ras, que beiram os US$ 380 bi­lhões, montante suficiente para manter a cotação sob controle.

A segunda razão, como expli­ca o vice-presidente executivo de Tesouraria do banco WestLB, Ures Folchini, é o perfil intervencionista do governo na taxa de câmbio. "Sabemos que não exis­te um regime de câmbio pura­mente livre em nenhum lugar do mundo, mas, no Brasil, o gover­no assumiu que é intervencionista", afirmou. "Nessas condições, declarações de autoridades têm muito efeito sobre as cotações." Desde o fim do ano passado, o mercado cambial vem sofrendo com o que os especialistas classi­ficam de "ruídos". Em dezem­bro, uma corretora internacio­nal publicou um relatório que le­vou os investidores a acreditar que o governo queria o real ainda mais desvalorizado.

O texto foi levado a sério por­que tinha como base uma conver­sa de bastidor com uma autorida­de de Brasília. O mercado, então, engatou uma sequência de valo­rizações da moeda americana, que culminou com a cotação de R$ 2,12 em 30 de novembro.

Para deter a escalada, o BC começou uma série de interven­ções. Além disso, houve uma se­quência de declarações públi­cas de autoridades indicando que o governo estava satisfeito com a moeda na faixa de R$ 2 a R$ 2,05. Um movimento contrá­rio se iniciou, com o dólar vol­tando a oscilar na faixa suposta­mente desejada por Brasília.

A tendência se manteve até a divulgação da ata da reunião de janeiro do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, no dia 24 de janeiro. No documen­to, a autoridade monetária mani­festou preocupação com o rumo da inflação no curto prazo.

A partir dessa informação, par­te dos investidores entendeu que o governo poderia permitir uma alta do real, mesmo que por período curto. A interpretação ganhou força depois que o BC re­novou antes do esperado contra­tos de câmbio que, na prática, equivaleram à venda de dólar.

Essa renovação de contratos do BC levou ainda mais confu­são aos mercados, porque no mesmo dia o ministro Mantega declarou, em sua primeira apari­ção pública de 2013, que o gover­no não ia permitir novo derretimento das cotações.

Segundo analistas, esses si­nais divergentes atrapalham os investidores. "Não estou preocu­pado com nossos operadores, que realmente ficam confusos diante dessas indefinições, mas sim com os investimentos na economia", disse Folchini. "Os empresários precisam de previsi­bilidade para tomar suas deci­sões. As expectativas para o câm­bio estão entre as variáveis que eles olham para se definir." / COLABOROU FABRÍCIO DE CASTRO