Título: Maior acesso a remédios
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Fonte: O Estado de São Paulo, 18/02/2013, Notas e informações, p. A3

Uma parceria en­tre a Organiza­ção Mundial da Saúde (OMS), a Organização Mundial do Co­mércio (OMC) e a Organiza­ção Mundial de Propriedade In­telectual (Ompi) resultou em um documento que orienta os países sobre como usar meca­nismos legais que facilitam o acesso a medicamentos. A ini­ciativa tem o objetivo de unir os esforços das principais enti­dades internacionais envolvi­das com o tema e articular solu­ções abrangentes para o proble­ma, que é mais grave nos paí­ses pobres, sem prejudicar nem o avanço técnico e científi­co nem os interesses comer­ciais. O remédio para enfren­tar esse desafio é, sem dúvida, eficaz: informação.

Nos países em desenvolvi­mento, os governos são pres­sionados a ampliar o acesso a medicamentos, especialmente em tempo de epidemias, sem que isso signifique aumento dos gastos em orçamentos já apertados. É aí que entra o as­pecto que interessa mais de perto ao Brasil, o das licenças compulsórias para a fabricação de remédios, conhecidas como quebras de patentes.

O argumento normalmente invocado para quebrar paten­tes de remédios é o da "emer­gência nacional", mas há casos em que a simples necessidade de tomar algum medicamento mais barato determina a ação dos governos. Um exemplo ci­tado pelo documento ocorreu na índia, em 2012. O governo considerou caro demais o me­dicamento Sorafenibe, que aju­da no tratamento de câncer de fígado e rins, e concedeu licen­ça compulsória a um laborató­rio de genéricos para fabricá- lo. A respeito do Brasil, o estu­do cita um caso de 2007, quan­do o governo, com base em le­gislação de 2001, quebrou a pa­tente do Efavirenz, um dos componentes do coquetel para tratamento de aids. Logo de­pois, o preço da dose caiu de US$ 1,59, valor do medicamen­to original, para US$ 0,43, va­lor do remédio genérico impor­tado da Índia. Segundo o estu­do, o Brasil economizou US$ 1,2 bilhão entre 2001 e 2005 so­mente com as licenças compul­sórias para esses medicamen­tos antirretrovirais. Há diver­sos casos como esses, em que os governos agiram ou porque os remédios estavam muito ca­ros ou porque não havia medi­camentos suficientes para aten­der à demanda.

A mera perspectiva da que­bra de patente tem servido pa­ra facilitar as negociações de governos de países em desen­volvimento com a indústria far­macêutica, diz o estudo. Mas há países desenvolvidos que também se beneficiam das li­cenças compulsórias - um dos exemplos mencionados é o de uma farmacêutica suíça que em 2002 obteve permissão pa­ra explorar um medicamento já patenteado nos EUA.

A título de orientação dos agentes públicos, o documen­to esclarece de que maneira funciona o sistema de prote­ção à propriedade intelectual e como ela pode ser flexibiliza­da para atender a determina­dos fins. Aborda também as re­gras de comércio internacio­nal e como elas influenciam na formação de preços, o que, em última análise, determina o efeito da barreira que separa o doente do medicamento. O es­tudo, que defende uma redu­ção de tarifas de importação de remédios, salienta que é preciso manter o mercado competitivo, de modo a esti­mular a inovação e sua disse­minação pelo mundo.

O aspecto mais relevante desse esforço concertado en­tre as principais entidades in­ternacionais de comércio e de saúde é de que há consenso so­bre a necessidade de facilitar o acesso a remédios onde eles são mais necessitados, preser­vados os direitos de quem os criou. Mesmo os remédios mais baratos, entretanto, ainda são inalcançáveis em grande parte dos países pobres. Pesqui­sa mencionada pelo jornal Va­lor (6/2) indica que a disponibi­lidade média de medicamentos essenciais no setor público em países de baixa e média renda é de meros 42% da demanda - um quadro inaceitável, que só será alterado se houver coope­ração global. Nesse ponto, po­de-se dizer que o Brasil, pionei­ro na concessão de licenças compulsórias e que lutou para que o direito a ser medicado contra a aids fosse considera­do um direito humano funda­mental, está na vanguarda.

-------------------------------------------------------------------------------- adicionada no sistema em: 18/02/2013 01:48