Título: O ajuste da Eletrobrás
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Fonte: O Estado de São Paulo, 25/02/2013, Notas e informações, p. A3

Para alcançar o equilíbrio financei­ro, sem afetar de­masiadamente seu bilionário progra­ma de investimen­tos, a Eletrobrás te­rá de cortar 30% de seus gastos correntes e aumentar suas receitas também em 30% nos próximos três anos. Esses números, anunciados por seu presidente, José da Costa Carvalho Neto, dão a di­mensão das imensas dificuldades por que passa a estatal. O corte de re­ceitas que lhe está sendo imposto pe­lo programa de energia do governo, destinado basicamente a reduzir tari­fas, soma-se a problemas que a em­presa já vinha enfrentando, em decor­rência da gestão político-partidária a que foi submetida por muitos anos. Será brutal o ajuste necessário para restabelecer sua saúde financeira.

A Eletrobrás, por causa de suas di­mensões e de seu papel no sistema elétrico brasileiro, foi a empresa mais afetada pelas regras do novo progra­ma para o setor elétrico, que fixou va­lores insuficientes para a indenização de usinas e linhas de transmissão cujas concessões fossem renovadas antecipadamente e tarifas igualmen­te abaixo do valor necessário para a operação das geradoras que aceitas­sem a renovação da concessão nos termos definidos pelo governo.

Em documentos e estudos encami­nhados ao Ministério de Minas e Energia, a empresa alertou que teria prejuízos bilionários caso as regras não fossem alteradas. No entanto, controlada pelo governo federal, a Eletrobrás foi obrigada a aceitar es­sas regras, pois o Planalto a utilizou como exemplo - sobretudo para as empresas estaduais controladas por governos tucanos que rejeitaram as condições de renovação das conces­sões - para mostrar a viabilidade do programa.

O preço que ela tem de pagar por isso é o aprofundamento de um ajus­te que, mesmo sem o programa de energia do governo Dilma, teria de ser drástico.

Desde o governo Lula, o setor elé­trico tem sido alvo de feroz disputa entre o PMDB e o PT. Para acomo­dar os interesses de sua base, o ex- presidente Lula nomeou pessoas in­dicadas pelos dirigentes partidários para a presidência e diretoria das principais empresas do setor, como Furnas, Chesf e Eletronorte, além da própria Eletrobrás. Dirigidas por critérios exclusivamente políticos, as estatais do setor elétrico perde­ram eficiência e acumularam maus resultados.

No início do governo Dilma, al­guns dos principais dirigentes do PMDB tentaram evitar que essa for­ma de aparelhamento do setor fosse modificada e procuraram preencher os cargos principais das empresas com nomes por eles indicados. Mas a presidente decidiu encarar a feroz resistência e as duras críticas de de­putados como Henrique Eduardo Al­ves e Eduardo Cunha - que preten­diam indicar nomes para a diretoria de Furnas, onde exerciam grande in­fluência -, e escolheu o nome que lhe pareceu mais adequado para pre­sidir a empresa. Por ironia, Dilma continua tendo de negociar com es­ses deputados: Alves é hoje presiden­te da Câmara e Cunha, o líder do PMDB na Casa. Para poder colocar na Eletrobrás o nome de sua prefe­rência, Dilma enfrentou a resistência do senador José Sarney.

Os resultados da acertada decisão da presidente começam a aparecer. Há alguns meses, o presidente de Fumas, Flávio Decat, anunciou um profundo programa de ajuste da em­presa a ser executado durante cinco anos e que prevê a redução de 35% de seu quadro de pessoal e corte de até 22% das despesas com materiais, serviços e outros itens.

Há pouco menos de um ano, Cos­ta Carvalho havia anunciado plano semelhante para a Eletrobrás, que, além das consequências negativas das gestões políticas por que passou, teve de absorver distribuidoras esta­duais em séria crise financeira. Es­sas distribuidoras, agora integradas ao Grupo Eletrobrás, continuam a gerar prejuízos, compensados pelos resultados de outras áreas de atua­ção da estatal. .

O uso político da Eletrobrás como instrumento para viabilizar o progra­ma elétrico do governo do PT força a empresa a fazer um ajuste ainda mais profundo. Espera-se que, mes­mo assim, a Eletrobrás consiga pre­servar seu programa de investimen­tos, de cerca de R$ 12 bilhões neste ano, para evitar problemas nesse se­tor vital para a economia.