Título: Itália não consegue formar governo e impasse faz mercados despencarem
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/02/2013, Internacional, p. A10

Crise. Sem maioria no Parlamento para comandar o país, coalizão de Pier Luigi Bersani rejeita aliança com grupo de Berlusconi e Bolsa de Milão cai 4,9%; Beppe Grillo, terceiro mais votado, recusa acordo com partidos que criticou durante a campanha eleitoral

Diante de um resultado eleitoral inconclusivo e do impasse na formação do novo governo, os principais partidos da Itália lançaram-se ontem em uma guerra declarada pelo poder e trouxeram de volta o clima de instabilidade para a Europa. Os mercados desabaram, enquanto líderes políticos reconheceram que a fase de incertezas poderá levar meses para ser superada.

A Bolsa de Milão caiu 4,9%, enquanto os spreads nos títulos de Itália, Portugal e Espanha sofreram um forte aumento. O euro voltou a perder valor para o dólar, enquanto hedge funds promoveram uma fuga em massa de ativos italianos. A Bolsa de Madri perdeu mais de 3,2%. A queda na Alemanha foi de 2%, em Londres, 1,4%, e em Paris, 2,7%. As bolsas dos EUA e da Ásia também sofreram.

Guido Westerwelle, ministro de Finanças da Alemanha, deixou claro que a Itália precisa continuar a reduzir sua dívida por meio de cortes. "A Itália tem um papel central na crise da dívida na Europa. Estamos todos no mesmo barco", alertou.

A crise em Roma levou à discussão aberta sobre a necessidade de um resgate financeiro da União Europeia para blindar o euro de uma contaminação. "A situação da Itália é dramática", afirmou Pier Luigi Bersani, líder do Partido Democrático (PD). Por seu partido ter sido o mais votado nas eleições de domingo e segunda-feira, ele será o primeiro a tentar formar um governo nas próximas semanas.

A eleição escancarou o protesto de milhões de italianos contra as políticas de austeridade do primeiro-ministro Mario Monti. No entanto, também abriu uma crise política diante da "ingovernabilidade" do país em razão da incapacidade dos partidos em obter maioria no Parlamento. Nas principais capitais europeias - e mesmo em Washington líderes não escondiam a preocupação.

Ontem, o primeiro a se manifestar foi Silvio Berlusconi, cuja coalizão obteve o controle apertado do Senado e ficou com a segunda maior bancada da Câmara. Para ele, a Itália deveria formar um governo de coalizão nacional e evitar novas eleições, que só poderiam ser convocadas depois de maio.

"Todos precisam estar prontos para fazer sacrifícios", disse, insinuando que estaria disposto a aceitar um acordo com Bersani, rival histórico. "Precisamos refletir agora. A Itália não pode ficar desgovernada."

Horas depois, Bersani subiu ao palco abatido. "Não vencemos, mesmo tendo chegado em primeiro", disse. O líder da centro-esquerda referia-se à possibilidade quase nula de conseguir formar um novo governo sem ter obtido uma maioria no Parlamento.

Líderes do PD já deixaram claro que não aceitam uma aliança com Berlusconi. Ainda assim, Bersani insinuou que estaria disposto a um acordo, sabendo que, sem isso, seu governo não sobrevive. Uma opção seria uma aproximação com a grande surpresa da eleição, o comediante Beppe Grillo, que obteve 25% dos votos, mas já anunciou que não fará alianças com partidos que atacou durante a campanha.

Bersani e Berlusconi temem que o impasse leve a uma nova eleição. O motivo: as projeções, apontam que, se isso ocorrer, há grande chance de Grillo sair com maioria suficiente para governar sozinho.

Por enquanto, a única certeza é que o imbróglio será longo. O novo Parlamento só se reúne no dia 15 e, no dia 21, o presidente italiano, Giorgio Napolitano, iniciará negociações para formar o governo. Até lá, o primeiro-ministro Mario Monti segue à frente do país.