Título: Declaração de Chapultepec completa 19 anos com apoio de 59 presidentes
Autor: Manzano, Gabriel
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/03/2013, Nacional, p. A8

Texto de 1994 se tomou instrumento decisivo para a defesa da liberdade de expressão na América Latina

A liberdade de expressão é um di­reito do cidadão, jamais uma con­cessão dos governos. O grande juiz das virtudes ou defeitos de uma publicação é o leitor. A me­lhor lei de imprensa é a que não existe. Foi com princípios como esses que a Declaração de Chapul­tepec, nascida no imponente cas­telo Chapultepec, na Cidade do México, se impôs como um dos instrumentos decisivos para a li­berdade de expressão na América Latina.

Passados 19 anos - que se com­pletam amanhã -, a declaração constitui um caso raro em que um código completo de normas foi criado pela sociedade para de­fender a democracia. Ela acabou sendo assinada por 59 presiden­tes dá República em 32 países.

"É um marco essencial na defesa e promoção da liberdade de ex­pressão e da liberdade de impren­sa, não apenas na América Lati­na, mas em todo o mundo", diz o diretor executivo da Associação Nacional de Jornais, Ricardo Pe­dreira. "Não tem força legal mas tem uma enorme autoridade", afirmou em uma palestra Santia­go Canton, um ex-relator sobre Liberdade de Expressão da Orga­nização de Estados Americanos. O aniversário será festejado ama­nhã pela Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) em Puebla, no México, onde ela realiza sua Reunião de Meio de Ano.

O documento de 1994 tem dez artigos curtos, que, no dizer dos estudiosos, valem tanto pelo que dizem quanto pelo que não é dito.

Uma das marcas do texto é o dinamismo: para divulgar e de­fender esses princípios, a SIP ins­talou o Projeto Chapultepec, que desde então promoveu mais de 20 fóruns internacionais. Criou ainda o Prêmio Chapultepec, pa­ra premiar trabalhos a seu respei­to. Um dos seus bons momentos foi o encontro em Bogotá, em ja­neiro passado, no qual o presiden­te Juan Manuel Santos reuniu 50 governadores e prefeitos do país. Todos subscreveram o documen­to. "Respeitar as diferenças é uma parte essencial de qualquer democracia", disse à época então o presidente colombiano.

"Muitos marcos foram estabe­lecidos. E nosso trabalhou não terminou", disse sobre esses fó­runs um dos presidentes do Co­mitê Chapultepec, Bartolomé Mitre, do jornal argentino La Nación. "Sabemos o que é viver sem liberdade de expressão", afirmou em outro encontro da SIP, em Fortaleza, o então presi­dente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) Francisco de Mes­quita Neto, hoje diretor executi­vo do Grupo Estado. A declara­ção teve um grande momento em 2001, quando seus dez princí­pios serviram de base para a De­claração de Princípios sobre a Li­berdade de Expressão, um dos pilares da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

Aceita hoje em todo o continente - à exceção de Equador e Vene­zuela -, a declaração tem ajudado a garantir o direito à informação num universo de 540 milhões de pessoas; segundo seus formuladores. Com o avanço, foram ganhan­do força a transparência, o direito de acesso às informações dos go­vernos, a despenalização de deli­tos como a difamação, dizem.

Brasileiros. A declaração se tor­nou um compromisso formal do Brasil em 9 de agosto de 1996, quando o presidente Fernando Henrique Cardoso a assinou. "Quando a imprensa perde a liberdade, é sintoma de que o povo também perdeu, o que é mais gra­ve", comentou FHC à época.

Antes desse "sim", no entanto, aconteceu um "não" - e quem o deu foi o antecessor, Itamar Fran­co. O então presidente se recusou a endossar os dez princípios, ale­gando que nada se dizia ali sobre "o necessário, imprescindível di­reito de resposta" a que qualquer um tem direito, caso se sinta pre­judicado por uma reportagem.

Em 2006, foi a vez de Luiz Iná­cio Lula da Silva, sucessor de FHC, aderir ao documento. Em solenidade no Palácio do Planal­to, diante de dirigentes da Associa­ção Nacional de Jornais (ANJ) e da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Lula afirmou: "No Brasil não há mais espaço pa­ra que a gente não compreenda, de uma vez por todas, que quanto mais poder temos, mais responsa­bilidade temos que ter. Isso vale para presidente, prefeito, gover­nador ou um grande jornalista".

Na última campanha presiden­cial brasileira, os três principais candidatos assinaram o texto.

O presidente equatoriano Ra­fael Correa chegou a dizer, no iní­cio de seu governo, que poderia assinar, desde que os meios de comunicação "respeitassem os direi­tos de seus trabalhadores".

/GABRIEL MANZANO