Título: Velório longo atrapalha vida de Caracas e esgota parentes
Autor: Lameirinhas, Roberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/03/2013, Internacional, p. A9

Venezuelanos continuam a passar 12 horas em fila para se despedir de Chávez, mas população reclama dos transtornos

Embora uma multidão ainda enfrentasse filas de até 12 horas para estar com Hugo Chávez pela última vez por 5 segundos, em média, o velório que se estendia ontem por 5 dias começava a causar um certo cansaço em Caracas. O luto oficial se estenderá até amanhã - assim como a lei seca e a proibição do porte de armas em todo o país, a redução das atividades dos serviços públicos e a restrição a festas e eventos comemorativos.

Proprietários de tascas - os tradicionais bares de Caracas onde se serve rum ao som de salsa e rumba - queixam-se do prejuízo de manter suas casas fechadas no fim de semana. "Ninguém é mais chavista do que eu e estamos todos tristes com o que aconteceu", disse ao Estado um desses comerciantes, sob a condição de anonimato. "Mas tenho de pagar o aluguel nesta semana e contava com o faturamento do sábado para poder fazer isso. Mesmo doloridos, temos de seguir vivendo."

O presidente encarregado da Venezuela, Nicolás Maduro, tem sido uma das mais frequentes personalidades vistas ao lado do caixão do líder. Mas as olheiras estavam claras ontem.

Maria Gabriela Chávez Colmenares, filha do presidente morto, estava esgotada demais para comparecer ao funeral de Estado, do qual participaram representantes de mais de 80 países na sexta-feira. A ausência causou algumas críticas e comentários não só entre membros da oposição, mas também entre alguns chavistas.

"Não estive lá porque não consegui me levantar. Estava esgotada. Sou humana, não? Deixem de inventar coisas", postou Maria Gabriela, na sua conta do microblog Twitter, no sábado. Filha mais velha de Chávez, ela acompanhara o pai na longa internação em Havana e Caracas.

Uma das presenças mais constantes ao lado do caixão durante o longo velório é a do ajudante de ordens de Chávez, o tenente Juan Francisco Escalona. Desde quarta-feira, ele é visto por horas, em pé e em silêncio, na cabeceira da urna - atento à procissão de milhares de simpatizantes chavistas que passam por ele.

"Só posso estar atento ao vidro que cobre seu féretro, o mesmo que às vezes se embaça porque seu povo não resiste a tocá-lo", escreveu o tenente Escalona na sua conta de Twitter, em um de seus poucos momentos de descanso nos últimos dias, às 7h15 de sábado. "Aqui sigo na frente de um sarcófago, junto a nosso povo grande, esse que chora, a gente humilde que sofre com seu descanso."

O tenente Escalona, que nunca fez declarações públicas, se tornou conhecido na Venezuela por acompanhar Chávez de perto onde quer que ele fosse. Num discurso em que falava da regulamentação da exploração mineral no país e levantou um lingote de ouro, em 2012, Chávez brincou com a proximidade do ajudante de ordens: "Cuidado, tenente Escalona. Se isso cair, cai no seu pé" /R.I