Título: Empresário aponta elo entre ditadura e quebra da Panair
Autor: Arruda, Roldão
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/03/2013, Nacional, p. A6

Comissão da Verdade pretende apurar se, nos anos 1960, regime militar contribuiu para a falência da companhia aérea

Documentos reunidos pelo em­presário Rodolfo da Rocha Mi­randa, filho de Celso da Rocha Miranda (1917-1986), um dos dois donos da companhia aérea Panair do Brasil, indicam que a falência da empresa, decretada em 1965, resultou de persegui­ção do governo militar (1964-1985). Os alvos eram Cel­so e seu sócio Mario Wallace Simonsen, ligados a Juscelino Kubitschek, presidente da Repúbli­ca de 1956 a1961 e, posteriormen­te, opositor da ditadura instala- da após o golpe militar que derru­bou o presidente constitucional João Goulart - chefe de Estado de 1961 a 1964.

Quando a empresa pediu con­cordata, o governo instituiu um decreto que impedia empresas aéreas de usarem esse instru­mento legal. Foi, então, decreta­da a falência da Panair. Depois, quando a empresa conseguiu pagar seus credores e, por lei, pode­ria voltar a operar, o governo criou outro decreto impedindo empresa aérea que houvesse fali­do de retomar os voos. Relató­rios do governo indicam que a Panair não era insolvente e ope­rava sem irregularidades.

Rodolfo obteve os documen­tos sobre a Panair em 2012, com base na Lei de Acesso à Informa­ção, e os encaminhou à Comissão Nacional da Verdade (CNV), que anteontem promoveu uma audiência pública no Rio de Ja­neiro para debater o caso. É o pri­meiro caso de empresa suposta­mente prejudicada pela ditadura militar a ser discutido pela Co­missão da Verdade.

Segundo Rosa Cardoso, inte­grante da comissão, mesmo se ficar demonstrado o prejuízo causado aos empresários donos da Panair, a investigação não vai gerar responsabilização crimi­nal de ninguém, em razão da Lei de Anistia, de 1979.

Rodolfo, de 63 anos, afirma também que não pretende pedir ressarcimento. "A intenção não é cobrar o prejuízo. Quero ape­nas que o Estado reconheça que a falência da Panair não foi culpa de seus donos, mas sim uma ma­nobra da ditadura", declarou o empresário.

Empresa. A Panair era a maior companhia aérea brasileira, com 5 mil funcionários, quando teve suas licenças de voo cassadas pelo governo militar, em 10 de fevereiro de 1965, sem nenhum aviso prévio. As rotas foram distribuí­das às demais companhias, prin­cipalmente à Varig.

Cinco dias depois foi decreta­da a falência da Panair, sob o ar­gumento de que a empresa esta­va em grave situação econômica, e isso representaria risco à segu­rança dos voos. Essa situação nunca foi comprovada.

Mario Wallace Simonsen mor­reu 37 dias após a decretação da falência. Celso da Rocha Miran­da discutiu o caso na Justiça até morrer, em 1986.

A falência foi extinta em 1995, quando a empresa pôde ser rea­berta. Hoje ela é dirigida por Ro­dolfo, mas seus únicos contratados são advogados que ainda dis­cutem judicialmente o caso.

O empresário disse que cogita contar a história da Panair por meio de uma minissérie.