Título: Pacote para o consumidor
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Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2013, Notas e informações, p. A3

Com intenção niti­damente eleitoreira, o governo bai­xou mais um pa­cote, tendo como mote desta vez a defesa do consumidor. Prepara­do de improviso, ele inclui me­didas já em vigor, outras que estavam em discussão e propos­tas diversas que parecem ter si­do tiradas do fundo de alguma gaveta.

Das novas medidas, nenhuma tem aplicação imediata e a de maior impacto - o fortalecimen­to da ação dos Procons, que pas­sariam a ter o poder de decidir sobre a restituição de cobran­ças indevidas relativas à com­pra e venda de mercadorias, sem passar necessariamente pe­la Justiça, desde que haja acor­dos prévios fechados nesses ór­gãos - ainda depende da aprova­ção de projeto de lei encaminha­do ao Congresso Nacional.

O aparato institucional ga­nhou mais um colegiado - a Câ­mara Nacional das Relações de Consumo, composta pelos mi­nistros da Justiça, Fazenda, De­senvolvimento, Planejamento e Casa Civil - que definirá o Pla­no Nacional de Consumo e Ci­dadania, incluindo sanções mais severas, em complemen­to ao Código de Defesa do Con­sumidor. A curto prazo, ela te­rá de relacionar 30 produtos considerados essenciais, que poderão ser trocados ou substi­tuídos imediatamente pelo ven­dedor se o consumidor identifi­car algum defeito.

Essa lista deverá ser discuti­da com o setor privado, poden­do incluir itens como fogão, ge­ladeira e aparelhos de telefone celular. Ainda não se sabe quan­do a medida entrará em vigor e qual o prazo para reclamações com direito à devolução e subs­tituição da mercadoria pelo fa­bricante ou pelo estabelecimen­to comercial. Aparelhos eletroeletrônicos geralmente têm pra­zo de garantia de funcionamen­to em perfeitas condições, sen­do prevista sua troca ou reparo em caso de falha. Segundo espe­cialistas em direito do consumi­dor, somente quando for divul­gada a lista será possível ava­liar se haverá alteração no siste­ma de comercialização.

Já as empresas que operam no comércio eletrônico, até agora não regulamentadas, se­rão obrjgadas, por decreto, a criar, no prazo de 60 dias, um canal de atendimento aos con­sumidores em seus sites. O e-commerce vem crescendo muito no País, acumulando paralelamente um grande núme­ro de queixas relativas a atra­sos e produtos trocados, nos ca­sos tanto de compras indivi­duais como coletivas.

Para tomar o pacote o mais abrangente possível, o governo mobilizou órgãos como o Con­selho Monetário Nacional (CMN) e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). O CMN reeditou e reforçou, em reunião extraordinária, al­gumas normas já em vigor, mas que não vinham sendo cumpri­das por todos os bancos. A par­tir de 1.° de julho, os bancos se­rão obrigados a obedecer a três padrões para a cobrança de tari­fas, exigindo-se também trans­parência nas operações de cré­dito e de câmbio. Deverão ser discriminados, em planilhas anexas aos contratos, os itens que compõem o custo total, in­cluindo tarifas, juros e encar­gos. O objetivo, como disse o diretor de Normas do Banco Central (BC), Sergio Odilon dos Anjos, é dar mais competiti­vidade ao setor bancário.

Com relação às telecomuni­cações, setor que é o campeão de reclamações aos Procons, a Anatel colocou em consulta pública uma série de medidas, que vão desde a proibição de vendas casadas de produtos e serviços, sistemas para compa­ração de tarifas, que apresen­tam grande variação entre uma e outra operadora, até a ampliação de atendimento pa­ra cobertura de 600 microrre- giões do País. A agência, po­rém, não relacionou quais são essas áreas, o que é essencial. Sabe-se que hoje, mesmo nas regiões mais desenvolvidas, as ligações por celular para mui­tas cidades ou bairros não po­dem ser completadas.

Embora não modifique nada a curto prazo, o pacote é ambi­cioso e presume que o BC e as agências reguladoras cumpram seu papel fiscalizador. As medi­das podem ter um efeito positi­vo, mas como disse o coordena­dor executivo do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Fulvio Gianella, "vamos ter de acompanhar de perto o gover­no" para que as novas regras se­jam efetivamente cumpridas no prazo previsto.