Título: É mais uma batalha vencida, diz sindicalista
Autor: Scholz, Cley
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2013, Economia, p. B4

Creuza comemora, mas representantes das donas de casa falam que haverá demissões em massa

A baiana Creuza Maria deOliveira tem 54 anos e esteve on­tem no Senado para acompanhar um dia que consi­dera simbólico na história do País, mas principalmente na suavida. Hoje ela é presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores Domésticos (Fenatrad). Mas começou a trabalhar em casa de família no interior da Bahia quando tinha apenas nove anos. "Fui porque minhafamília era mui­to pobre, em troca de comida e de roupa usada... Eu era xingada, maltratada, sofria assé­dio moral e abuso sexual", re­latou.

Ontem, porém, sentada ao lado do presidente do Sena­do, Renan Calheiros (PMDB- AL), ela não se intimidou. Acompanhou e comemorou a aprovação da PEC que garan­te às empregadas domésticas os mesmos direitos já assegu­rados há muitos anos aos tra­balhadores urbanos e rurais.

Longe de ficar constrangida com a grandiosidade do espaço, seu único medo era de que a Casa não tivesse quórum suficiente para aprovar a proposta, às vés­peras do feriado da Páscoa. "Quando olhei ali para o painel, e vi que foi aprovada por 66 vo­tos, me deu um alívio muito gran­de. É um sentimento de vitória, mais umabatalha vencida." Eliana Gomes Menezes, presidente do Sindoméstica-SP, tam­bém passou o dia em Brasília on­tem. Ela veio com outras 22 cole­gas, todas domésticas na Grande São Paulo, para acompanhar avo- tação. "Neste momento, o em­pregador está assustado, como sempre que aumenta o salário, mas ele vai se adaptar, porque não é um gasto tão grande." Diferente de Creuza, Eliana contanunca ter sofrido nenhum tipo de agressão ou maus-tratos de patrões. "No sindicato che­gam muitos casos em que a em­pregada é submissa e, às vezes, o empregador extrapola os limi­tes. Com a PEC vai melhorar o respeito com a profissão."

Mais tranqüilas. Em Franca, in­terior de São Paulo, feliz da vida está a doméstica Tereza Aparecida da Silva, 46 anos, divorciada e mãe de quatro filhos. Para ela, o FGTS, por exemplo, é um direito que todo trabalhador deve ter, independentemente da função que exerce. "Se todos os traba­lhadores têm esses direitos, por que nós também, que cuidamos com toda dedicação da casa, não podemos ter?", questiona. Ela diz acreditar também que as me­didas vão contribuir para deixar as empregadas domésticas mais tranquilas para enfrentar qual­quer tipo de problema, como ca­sos de doença na família.

Já a empregada Sílvia Dias do Carmo, 39 anos, também de Franca, diz que os benefícios se­rão uma grande garantia de um futuro mais promissor. "A nossa vida é viver em função dos filhos, do marido e agora,tendo essa garantia da lei, com certeza vamos poder pensar num futuro me­lhor para a nossa família."

Do lado dos patrões, a avalia­ção é de que a decisão deve pro­vocar demissão "em massa" nas residências brasileiras. Na avalia­ção da direção do Movimento das Donas de Casa de Minas Ge­rais (MDCMG), pelo menos em um primeiro momento haverá uma "debandada geral" da procu­ra por domésticas por causa dos custos com novos encargos.

Segundo a diretora jurídica do MDCMG, a advogada Geralda Lopes de Oliveira, as donas de casa "já estavam alarmadas" des­de o início da tramitação da PEC 66/2012. "Agora, estão apavora­das, porque vai ser um aumento grande de despesas para todo mundo. A receita das pessoas não cresceu e o custo de vida já aumentou muito. Desse modo, como cobrir aumento de despesa?"

"Todo ano crescem as resci­sões (de contrato) sem moti­vo quando tem aumento do salário mínimo", diz Geralda. "As donas de casa não têm pu­dor em dizer que não têm co­mo pagar e vai haver demis­são em massa." / débora ÁLVARES, DE BRASÍLIA; RENE MOREIRA, DE FRANCA; e MARCELO PORTELA, DE BELO HORIZONTE