Título: Socorro ao Chipre não será modelo, garante EU
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2013, Economia, p. B10

Reação dos mercados ao plano de resgate mobilizou autoridades da União Europeia

Autoridades de Bruxelas e do Banco Central Europeu (BCE) desmentiram ontem que o plano de resgate do Chipre, anunciado na madrugada de segunda-feira, seja o novo parâmetro de intervenções externas em países em crise na Europa. O temor de que o confisco de depósitos no sistema financeiro se torne uma prática corrente levou bolsas de valores a quedas generalizadas e preocupou investidores, que temem grandes perdas em caso de mais turbulência em bancos da Espanha e da Itália.

Ontem, vários líderes europeus foram à imprensa tentar apagar o incêndio causado pelas declarações de Jeroen Dijsselbloem, ministro de Finanças da Holanda e coordenador do fórum de ministros da zona do euro (Eurogrupo). Na segunda-feira, Dijsselbloem afirmou que os contribuintes não devem arcar com o resgate de instituições financeiras que assumem riscos excessivos em busca do lucro. "Tirar o risco do setor financeiro e levá-lo aos ombros públicos não é a abordagem correta", disse ele, completando: "Essa é a abordagem que nós, agora que estamos fora do calor da crise, deveremos tomar".

Depois de seu pronunciamento, os mercados financeiros fecharam em baixa em toda a Europa, especulando que o programa de socorro ao Chipre - que incluiu a restruturação do sistema financeiro, a extinção do segundo maior banco do país (o Laiki) e o confisco dos depósitos superiores a € 100 mil - se torne referência. Em troca, o governo cipriota terá acesso a uma linha de crédito de € 10 bilhões, que se somará a € 7 bilhões em recursos próprios - o que faz do programa de resgate o maior da Europa em porcentual do PIB do país, 90%.

Com a repercussão negativa das declarações, Dijsselbloem convocou a agência Reuters, o jornal britânico Financial Times e o diário francês Le Monde para entrevistas nas quais afirmou que o Chipre "não será modelo ou parâmetro" de socorro de Bruxelas ou do Fundo Monetário Internacional (FMI). "O Chipre é um caso específico, com desafios excepcionais que exigem as medidas de resgate que acordamos."

Autoridades do BCE também vieram a público na Alemanha e na França "corrigir" a informação. À rádio Europe 1, de Paris, o economista Benoit Coueré, membro do conselho do banco central, afirmou que a situação do Chipre "é única".

Para Céline Antonin, especialista em zona do euro do Escritório Francês de Conjunturas Econômicas (OCFE), as declarações de Dijsselbloem foram de fato desastradas. "O socorro ao Chipre não é um modelo para a Europa porque o país é um caso de macrocefalia bancária. Para muitos, é um paraíso fiscal, o que levou as autoridades a tomar essas medidas", disse ao Estado.

Demissão. A polêmica envolvendo o plano de socorro ao sistema financeiro cipriota cresceu ontem em Nicósia, capital do país, depois que o presidente do Banco do Chipre, o maior do país, pediu demissão. Andreas Artemis se disse contrário ao projeto de fusão da instituição com o banco Laiki e ao confisco de 30% a 40% dos depósitos superiores a € 100 mil dos clientes.

Diante da tensão, o Banco Central do Chipre anunciou o prolongamento do feriado bancário iniciado em 16 de março até, pelo menos, quinta-feira, em razão dos trabalhos de fusão das duas principais instituições do país.