Título: Abertura evidencia problemas de Mianmar
Autor: Boussidan, Solly
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/04/2013, Internacional, p. A11

Apesar dos passos rumo à democracia, governo birmanês é acusado de violar direitos de etnias e manter censura indireta sobre a mídia

Os problemas de Mianmar vão muito além da economia. O primeiro grande teste para o novo governo civil birmanês veio na forma de protestos contra mineradoras chinesas operando em Monywa, no no­roeste do país, em dezembro. A polícia diz ter utilizado meios não letais para disper­sar os manifestantes, entre eles dezenas de monges budis­tas, que reclamavam de doen­ças causadas pelo excesso de enxofre usado pelos chineses.

Nos bastidores, o governo não esconde temer que os proble­mas com as mineradoras afetem as relações com Pequim, já pres­sionadas pela suspensão tempo­rária da construção bilionária de uma hidrelétrica, em Myitsone, que levaria eletricidade até a pro­víncia chinesa de Yunan, em ra­zão das preocupações ambien­tais e dos protestos da popula­ção de vilarejos em Mianmar, que serão inundados.

O governo do presidente Thein Sein é ainda acusado de desrespeitar os direitos huma­nos de minorias étnicas. Mian­mar tem mais de 130 etnias, e conflitos já deixaram cerca de 120 mil refugiados no oeste do país. Além disso, o governo está em combate com grupos rebel­des das etnias kachin e karen, nas regiões leste e norte.

Segundo a organização de di­reitos humanos Anistia Interna­cional, violações graves têm ocorrido frequentemente con­tra esses grupos, entre eles estu­pros cometidos por militares, uso de escudos humanos, tráfico de mulheres e trabalhos força­dos por prisioneiros. Relatórios da ONU e da Organização Inter­nacional do Trabalho citam pelo menos 96 casos onde crianças fo­ram alistadas de forma forçada ou ilegal nas forças militares do país, em 2012.

As recentes reformas que ga­rantiram maiores liberdades à imprensa tambémvêm sendo al­vo de críticas. "Apesar de termos mais liberdade para reportar, o governo continua a utilizar táti­cas de intimidação contra jorna­listas que questionam a linha ofi­cial", diz Ross Dunkley, editor- executivo do Mianmar Times.

"Há certos assuntos que sabidamente não podem ser reportados, mesmo que não haja mais censura prévia do governo. Tu­do que seja relacionado à segu­rança nacional, à soberania ou, especialmente, que diga respei­to aos militares está fora dos limi­tes", explica San Oo, editor de política do jornal.

Os temas relacionados aos con­frontos entre militares e mino­rias étnicas enquadram-se na lis­ta de assuntos proibidos à im­prensa. Segundo reportagem do New York Times, o Google notifi­cou jornalistas e analistas políti­cos, em fevereiro, sobre "ataques patrocinados por agentes gover­namentais, que estariam tentan­do comprometer a integridade da sua conta de e-mail". O Goo­gle percebeu a interferência após um grupo jornalístico de Mianmar noticiar que o Exérci­to estava usando aviões para atacar a etnia kachin no norte.