Título: Portugal volta a cortar gastos sociais
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/04/2013, Economia, p. B7

Decisão por novas medidas de austeridade veio depois de Justiça do país vetar cortes nos salários e pensões dos funcionários públicos

Anunciando que Portugal está em um "estado de emergência nacional", o primeiro-ministro luso, Pedro Passos Coelho, decretou uma nova rodada de medidas de austeridade, com drásticos cortes em saúde, educação e previdência social.

A medida, anunciada em rede nacional na noite de ontem, seria uma forma desesperada para evitar que Lisboa peça um segundo resgate à União Europeia, depois que o Tribunal Constitucional do país vetou cortes nos salários e pensões de funcionários públicos, parte do plano de austeridade para 2013.

Para analistas, a indefinição sobre o resgate em Portugal abre uma nova crise política no Velho Continente e os mercados já se preparam hoje para mais um período de tensão.

Tanto a UE quanto o Fundo Monetário Internacional (FMI) exigiam de Portugal economias drásticas no orçamento de 2013, para que as parcelas de seu resgate de € 78 bilhões fossem liberadas. O acordo estabelecia que o governo português precisaria reduzir em € 5 bilhões seu orçamento para 2013. Mas o Tribunal julgou a decisão de cortar salários e pensões de inconstitucional, o que obrigou o governo a buscar uma nova fonte para uma economia de € 1,3 bilhão.

A solução, segundo o governo, foi a de transferir atodaa população o preço do ajuste. "Temos de evitar um novo resgate", disse. "A alternativa a não cumprir as obrigações com nossos sócios é precisamente essa, a de pedir uma nova ajuda. Mas isso não se evita com boas palavras e boas intenções, mas sim com fatos concretos. Não será fácil, não há muita margem", disse. Para ele, a decisão do Tribunal tem "consequências muito sérias para todo o país".

Vida difícil. Os cortes virão no setor da saúde, educação, empresas públicas e previdênciasocial, e o próprio governo já admitiu que "a vida ficará mais difícil". Coelho insistiu que outra opção para atender às exigência da Troica (UE, FMI e Banco Central Europeu) seria a de elevar impostos. Mas que teria optado por uma nova redução de investimentos.

A meta estabelecida à Portugal é de que seu déficit não deveria passar a marca de 5,5% do PIB ao final de 2013. Mas, diante da explosão do desemprego - a 18% - e mais um ano de recessão, membros do governo negociam com a UE um adiamento dessa meta para 2014. Em 2012, Portugal já não atingiu suas metas de redução de dívida e, ainda assim, o PIB sofreu contração de 3,2%.

A oposição portuguesa já declarou ontem mesmo que não apoiará o novo corte e exige que os termos do resgate com os europeus sejam renegociados.

A oposição também deixou claro que o atual primeiro-ministro precisaria renunciar e convocar novas eleições. Há dois anos, foram os socialistas que acabam sendo derrubados, depois que não conseguiram fazer passar um projeto de austeridade pelo Parlamento. O secretário nacional do Partido Socialista, João Ribeiro, acusou Passos Coelho de "inventar um álibi para desculpar um Orçamento do Estado que estava condenado".

"O Governo fala e atua como se Portugal já não fosse um país soberano nem um membro de pleno direito da União Europeia", afirmou Ribeiro, que acusou ainda Passos Coelho de "chantagear os portugueses".

No sábado, a imprensa portuguesa revelou que, de fato, a renúncia em bloco de todo o gabinete chegou a fazerparte dos debates em uma reunião de emergência convocada por Coelho.

O primeiro-ministro se reuniu em caráter de emergência com o presidente português, Aníbal Cavaco Silva, com a meta de conseguir do chefe de Estado uma indicação pública de que o governo seria mantido. Cavaco Silva acabou emitindo um comunicado garantindo a estabilidade do governo, indicando que Coelho tem "condições para cumprir com o mandato que lhe foi encomendado".