Título: BOA SURPRESA
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Fonte: O Globo, 07/03/2005, Economia, p. 18
Os resultados da balança comercial em janeiro e fevereiro contrariaram as previsões e agora o mercado está revendo para cima as projeções relativas a 2005. A expectativa era de que a contribuição direta do comércio exterior para o Produto Interno Bruto (PIB) diminuísse, quando comparada a de 2004. Mas já há simulações que apontam para um superávit de US$40 bilhões.
Possivelmente não chegaremos a tanto. No entanto, pelo andar da carruagem, é bem possível que o saldo de 2004 (US$34 bilhões) se repita ou ocorra até algum crescimento. Vão aumentar as receitas com as vendas de minério de ferro, ferro gusa, aço e demais produtos siderúrgicos, veículos e autopeças, aviões, café, carnes, açúcar e álcool, algodão, petróleo e derivados, cobre, alumina e alumínio, celulose. Embora as cotações da soja tenham caído, espera-se que o aumento no volume dos embarques compense a perda. E mesmo nos manufaturados que estão sendo mais afetados pela apreciação do real (calçados, por exemplo), os contratos a serem cumpridos garantem uma receita igual à do ano passado.
No caso do petróleo, haverá uma inversão na conta, e até o fim do ano a balança comercial mensal deve ficar equilibrada, pois a produção nacional estará sendo ampliada em 300 mil barris por dia.
Com as exportações se mantendo na função de alavanca da economia, o PIB deve crescer por volta de 4%. A economia só não se expandirá mais porque a política de juros altos do Banco Central está propositadamente desaquecendo o mercado interno, na tentativa de segurar a inflação de 2005 em 5,1%.
Se havia alguma possibilidade de fusão ou associação entre a CSN e o grupo Usiminas/Cosipa ela deixou de existir depois que a família Steinbruch assumiu o controle total da siderúrgica de Volta Redonda. Benjamim Steinbruch, que preside o conselho da CSN, é tido no meio empresarial como centralizador, enquanto a Usiminas é dirigida por um executivo que já estava à frente do grupo antes mesmo da privatização das principais companhias do setor.
Esse estilo de desconfiar da própria sombra (ou de quem possa lhe fazer sombra) teria levado Steinbruch a transferir a administração da CSN para São Paulo, onde mora. Tal decisão, além de deixar a companhia com problemas de identidade ¿ a CSN não é hoje mais vista como empresa fluminense, nem paulista, e vai perdendo seus vínculos até com a própria cidade que criou ¿ obriga seus altos funcionários a virem freqüentemente ao Rio, pois quase todas as operações da companhia estão no Estado (fabricação de aço em Volta Redonda, exportação e importação de produtos pelo porto de Sepetiba, etc).
No ano passado, a CSN atingiu o limite de sua capacidade para fabricar aço no Brasil, e mesmo que comece amanhã a construir um novo alto forno, somente em três anos estará produzindo mais. A empresa reduziu o ritmo de investimento na fabricação de aço, resolveu se tornar exportadora de minério de ferro e decidiu distribuir para os acionistas em dividendos e juros sobre capital próprio (metade dos quais irá para a holding de Steinbruch) a totalidade de seus lucros. Por sinal, excelentes em 2004, mas inferiores aos da Usiminas/Cosipa.
Enquanto a CSN passou a ter um único sócio majoritário, o controle acionário do grupo Usiminas/Cosipa é compartilhado. Em ambas empresas a parceria com os empregados foi fundamental para o êxito da privatização, mas no caso da CSN a participação do fundo de pensão (CBS) e do clube de investimentos dos funcionários decresceu ¿ muita gente se aposentou ou se desligou da companhia, preferindo vender as ações com lucro.
Em suma, as maiores siderúrgicas do país trilham hoje por estilos de administração bem diferentes, e uma fusão não teria chance de dar certo. Seria como misturar água e azeite.
O crédito se expandiu fortemente no passado, mas as micro e pequenas empresas continuam passando ao largo. O microcrédito, que seria uma alternativa para companhias desse porte, ainda não deslanchou porque os grandes bancos preferem transferir ao Banco Central, sem qualquer remuneração, 2% dos seus depósitos à vista, do que correr o risco de aplicar esses recursos em tal segmento. A exceção continua sendo o Banco do Nordeste, cujo modelo foi bem-sucedido e já responde por metade das operações de microcrédito no Brasil.
Existem hoje 47 instituições, com fins lucrativos, autorizadas a operar exclusivamente com microcrédito no país. Os empréstimos não podem passar de R$10 mil, o que é relativamente pouco para empresas classificadas, para efeito fiscal, como micros (faturamento anual de até R$430 mil) ou pequenas (receita de até R$1,5 milhão por ano).
As instituições especializadas em microcrédito podem emprestar até cinco vezes o capital próprio e suas operações ainda se resumem a financiamentos de curto prazo, seis meses, no máximo). Estão credenciadas a repassar recursos do BNDES, mas na prática isso não tem funcionado, porque o banco limita o ganho total do intermediário a 1% ao mês. Em um empréstimo no valor máximo de R$10 mil, esse ganho seria de R$100 ao mês. No entanto, como a média das operações gira em torno de R$1 mil, o ganho se reduz para R$10 mensais, o que não compensa os custos e nem os riscos do negócio.
Da forma como está configurado, o microcrédito se restringirá aos financiamentos concedidos por organizações não-governamentais, que geralmente recebem recursos a fundo perdido.