Título: MP RECORRE CONTRA TENTATIVA DE CENSURA AO IBGE
Autor: Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 12/03/2005, O País, p. 12

Objetivo de procurador é evitar que pesquisas do instituto tenham de ser submetidas ao governo antes da divulgação

SÃO PAULO. O Ministério Público Federal impetrou ontem uma ação civil pública pedindo o fim do embargo do Ministério do Planejamento à divulgação de pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na ação, o procurador Márcio Schusterschitz da Silva Araújo argumenta que o embargo pode ter objetivos políticos e pede uma liminar que suspenda imediatamente a portaria que limita a divulgação das pesquisas.

¿ O problema não é sequer o risco de censura, até porque não tenho dados que me permitam afirmar isso, mas o governo pode formular previamente um discurso de acordo com os dados ¿ disse o procurador da República.

Pesquisa sobre obesidade deu início à polêmica

A reação do governo à publicação de pesquisas do IBGE começou em 28 de janeiro. Na época, o instituto publicou uma pesquisa mostrando o aumento da obesidade no país. O governo interpretou a pesquisa como um entrave para o discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de prioridade ao combate à fome.

Por precaução, o Planejamento publicou uma portaria pela qual obriga o IBGE a fornecer suas pesquisas ao governo pelo menos 48 horas antes de divulgá-las à imprensa.

"Os dados divulgados pela fundação são retratos de uma realidade fática objetiva e, assim, de forma alguma estão sujeitos a qualquer valoração administrativa quanto à sua conveniência ou oportunidade", argumenta o procurador na ação.

Segundo ele, se o Ministério do Planejamento não tem legitimidade nem intenção de vetar ou manipular os dados levantados pelo IBGE, não existe motivo para o embargo.

Temor de que portaria sirva para encobrir erros

"Os dados servem para nortear as atividades públicas e privadas desenvolvidas no país. São dados para subsidiar a tomada de decisões e valorar determinados fatos não apenas no âmbito governamental, mas também no âmbito privado", diz o procurador.

No texto, Araújo sugere que o objetivo do embargo é possibilitar a construção de desculpas para supostos erros do governo e levanta a possibilidade de censura.

"Introduzir uma fase pré-divulgação é, de alguma forma, buscar novos contornos para a insuperavelmente ultrapassada expressão 'the king can do not wrong' (o rei não pode estar errado), que sustentava a irresponsabilidade civil do Estado", diz ele. "O (embargo) traz o risco de suspeitas quanto à sua censura ou artificial formulação de justificativas ou argumentações em defesa de tal ou qual decisão política ou administrativa que virá a ser utilizada quando de sua divulgação. Quebra, pois, de toda forma a transparência sobre a atividade governamental", completa.

Ministério Público Federal pediu antecipação da tutela

A ação foi protocolada ontem na Justiça Cível Federal de São Paulo. Além do fim da portaria, o Ministério Público Federal pede a antecipação de tutela, ou seja, a concessão de uma liminar que derrube os efeitos da decisão governamental enquanto o processo estiver em julgamento. A troca no sistema de informática da Justiça Federal deve atrasar o julgamento da ação.