Título: LÍDER DO PT TRABALHOU PARA ITAMAR E FH
Autor: Lydia Medeiros
Fonte: O Globo, 13/03/2005, O País, p. 8

Delcídio ocupa cargo que foi da senadora Ideli, sua ex-inimiga política

BRASÍLIA. O currículo do engenheiro eletricista Delcídio Amaral em nada lembra o de um petista militante: ocupou cargos em grandes empresas, inclusive a multinacional Shell; foi ministro de Minas e Energia do ex-presidente Itamar Franco e diretor da Petrobras no governo Fernando Henrique Cardoso, por indicação do então senador Jader Barbalho (PMDB-PA). Hoje, Delcídio, senador por Mato Grosso do Sul, é o líder do PT.

Entrar na política e no partido exigiu persistência. Até assinar a ficha de filiação, Delcídio era alvo de ações judiciais de sindicalistas que contestavam sua conduta na Diretoria de Finanças da Eletrosul. À frente dos protestos estava, entre outros, Ideli Salvatti (SC), hoje colega de bancada no Senado. Ideli nunca deu sossego a Delcídio. Tentou também impedir sua entrada no partido. Quando ambos se elegeram senadores, Delcídio deu o troco:

¿ Que vida, hein, Ideli? Agora nós estamos aqui. E pelo PT.

O padrinho de Delcídio foi o governador de Mato Grosso do Sul, Zeca do PT: participou de seu Secretariado e presidiu empresas do estado. Mas a decisão final, em 2001, só foi tomada depois de longo jantar com o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, em São Paulo. Por volta das 2h da madrugada, Delcídio se convenceu. Os amigos do PSDB achavam que ele havia enlouquecido.

Superadas as resistências dos diretórios municipal e estadual do PT, Delcídio ainda era visto como um estranho. A idéia de concorrer ao Senado surpreendeu. Seus oponentes seriam o senador Ramez Tebet (PMDB), ex-presidente do Senado, e o ex-governador Pedro Pedrossian (PP). Perdeu 15 quilos na campanha e ganhou de Pedrossian por uma diferença de quatro pontos percentuais.

Em sua página na internet, o senador invoca a vitória e deixa a modéstia de lado: ¿Delcidio Amaral chega ao Senado da República como um fenômeno político raro, talvez inédito¿.

¿Ah, o senhor não é do PT. Não consigo lembrar disso¿

Os novos colegas custaram a identificá-lo com o PT. No início do mandato, em 2003, depois de ver o governo Lula apanhar sem trégua e sem réplica, o senador Heráclito Fortes (PFL-PI) observou a ausência de petistas em plenário. Delcídio mostrou-se presente. Mas Heráclito não se convenceu:

¿ Ah, o senhor não é do PT. Não consigo lembrar disso, senador ¿ ironizou.

A escolha de Delcídio para líder, como sucessor da antiga adversária Ideli, foi exaustivamente negociada pelo líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP). Na bancada, persistia o argumento de que um petista novato e sem história na esquerda não poderia ocupar o cargo.

Até chegar a líder, aos 50 anos, o desempenho do senador era quase apagado. Apresentou um projeto de emenda à Constituição, 14 projetos de lei e nove requerimentos, cinco deles a ministros. O perfil liberal fica claro num desses projetos: propôs a inclusão nos cursos superiores de disciplina que incentivaria o desenvolvimento de empreendimentos próprios. A proposta foi rejeitada na Comissão de Educação e arquivada. O senador evita rótulos:

¿ Não há economia de esquerda ou de direita. Há economia competente ou incompetente.

Em 2003, Delcídio fez 22 discursos. Em 2004, 13. No último mês, já foi à tribuna seis vezes. Mercadante gostaria de vê-lo ainda mais presente. Candidato ao governo de Mato Grosso do Sul, Delcídio dá prioridade a assuntos estaduais. A dedicação irrita o companheiro:

¿ Ele é firme e bom negociador, mas está preso ao projeto regional. Terá de se destacar pela atuação nos temas nacionais ¿ diz Mercadante.