Título: O DISCURSO QUE NÃO HOUVE
Autor: Lydia Medeiros
Fonte: O Globo, 16/03/2005, O País, p. 12
Figueiredo se negou a dar posse a Sarney
BRASÍLIA. Há duas décadas, o último dos generais-presidentes do ciclo militar deixava o Palácio do Planalto pela porta dos fundos com um pedido à nação: queria ser esquecido. Nas comemorações da redemocratização do país, entretanto, o general João Baptista Figueiredo foi lembrado de forma inédita. A TV Senado revelou ontem trechos do discurso de despedida jamais lido por Figueiredo na cerimônia de posse de José Sarney, da qual ele estava ausente.
O documentário ¿Vinte anos da redemocratização¿, dirigido pelo jornalista Chico Sant'Anna, obteve a íntegra do discurso, confiado desde 1985 a um militar de alta patente. No vídeo, as palavras de Figueiredo são lidas pelo general Danilo Venturini, chefe do Gabinete Militar do ex-presidente.
Figueiredo preparara o discurso para a posse de Tancredo Neves, e se recusou a fazê-lo para José Sarney, a quem considerava um traidor por ter deixado o PDS e se aliado ao PMDB. No pronunciamento de oito laudas, Figueiredo se diz de ¿alma lavada¿ e com o ¿sentimento do dever cumprido¿ ao transmitir o cargo a Tancredo, que ¿conta com o beneplácito popular¿ e ¿saberá governar de forma correta¿.
À época, Figueiredo justificou a ausência com as regras do cerimonial, que previa transmissão do cargo apenas de presidente para presidente.