Título: TRIBUTO DO DESEQUILÍBRIO
Autor: Aguinaldo Novo
Fonte: O Globo, 16/03/2005, Economia, p. 21

Imposto no Rio pesa mais que gasto com saúde e vestuário. No país, é a 5ª maior despesa

Opagamento de tributos diretos já representa 6,63% das despesas correntes de cada morador na Região Metropolitana do Rio. De um gasto médio mensal de R$526,54, itens como Imposto de Renda, IPTU e IPVA engolem R$34,91. É mais que o dobro da média nacional (R$16,57) e acima do que se paga com saúde, vestuário ou educação. A situação não é diferente em São Paulo, onde o desembolso com tributos chega todos os meses a R$29,32, ou 4,84% de uma despesa geral de R$605,26 per capita.

No Brasil, o peso dos impostos (4,61% dos gastos de cada habitante) só perde para habitação, alimentação, transporte e saúde.

O retrato desse país desequilibrado pelo aumento progressivo da carga tributária emerge do ProConsumo, banco de dados com 11 milhões de informações lançado ontem pela Federação do Comércio de São Paulo (Fecomércio-SP) e pela consultoria Tendências. Cruzando estatísticas da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do censo demográfico e das contas nacionais, o sistema mede o poder de consumo nos 5.560 municípios do país.

Para chegar aos R$526,54 per capita, o ProConsumo dividiu o consumo mensal na Região Metropolitana do Rio (R$6,2 bilhões) pelo seu número de habitantes (mais de 11 milhões de pessoas). No ranking das despesas, o valor desembolsado com impostos diretos é o quarto maior. O primeiro é habitação (R$168,58, 32,02% do total), seguido por alimentação (com fatia de 15,36%) e transportes (com 14,3%).

Classe A: gastos com festa e desigualdade

Com o Leão pendurado no bolso, o consumidor no Grande Rio tem de apertar os gastos essenciais. As despesas mensais com saúde não passam de R$30,48 per capita. Com vestuário, o valor cai para R$18,83 e com educação, para R$18,68. Já na Região Metropolitana de São Paulo, gasta-se mais com tributos (R$29,32 mensais per capita) do que com mensalidades e livros escolares (R$R$25,44) e com vestuário (R$23,29).

¿ E estamos falando só dos impostos diretos. Não foi medido o peso dos indiretos, embutidos no preço de produtos e serviços, que na média podem equivaler a 30% do total ¿ afirmou o diretor-executivo da Fecomércio-SP, Antônio Carlos Borges.

Segundo ele, como as alíquotas do Imposto de Renda são iguais para todos os contribuintes, o que empurra para cima o resultado no Rio é a diferença entre os estados na tabela de IPTU e IPVA. Corroborando essa análise, em estudo publicado no mês passado, o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) estimou em 30% o aumento dos tributos municipais em 2004, que chegaram a R$29,9 bilhões ¿ superando o crescimento de 21,3% nas receitas de impostos arrecadados pelos estados, e de 15,4%, pela União. Ainda no caso da Região Metropolitana do Rio, a conta final é afetada por seu padrão de consumo, 46% superior ao da média nacional.

Nova consulta ao programa ProConsumo mostra também desigualdade na distribuição de renda no Brasil. As despesas totais das famílias da Região Metropolitana de São Paulo e com renda superior a 30 salários-mínimos (equivalente hoje a R$7.800) totalizam R$3,5 bilhões. Esses consumidores formam a chamada classe A. O valor supera o gasto total mensal registrado em todos os estados da Região Norte somado ao de Alagoas (o que dá R$3,43 bilhões).

O banco de dados permite fazer também pesquisas por produtos ou serviços. Por mês, a classe A na cidade de São Paulo desembolsa R$36,6 milhões com festas e cerimônias variadas (da festinha de aniversário dos filhos a batizados e casamentos), quantia semelhante ao consumo individual de arroz, feijão e outros cereais em 12 estados brasileiros, como Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Sergipe ou Tocantins, além do Distrito Federal.

Os paulistanos também desembolsam todos os meses R$32,9 milhões na compra de perfumes, mais do que a despesa com o mesmo item em 5.320 dos 5.560 municípios mapeados pelo ProConsumo. A predominância de São Paulo reflete o fato de que a renda per capita na região é 49% maior do que a média do país.

A distribuição dos gastos com tributos entre os estados também não é uniforme. Enquanto a média nacional por consumidor é de 4,61% do total das despesas, em estados como Tocantins esse percentual chega a 9,07%. No Rio, é de 6,42% e em São Paulo, de 6,64%. Já no Maranhão, o montante é de 1,68%. De novo, as razões vão do valor das alíquotas dos tributos ao perfil de consumo de cada região. Mas outra possível explicação, diz a Fecomércio, é a sonegação de impostos.