Título: Regra de mercado
Autor:
Fonte: O Globo, 19/03/2005, Opinião, p. 6
Trabalhar não é demérito, ainda que por algum tempo tenha sido na cultura ibérica (quando fidalgos evitavam tomar sol para manterem as peles alvas e não serem confundidos com aqueles que trabalhavam). Além de produzir riquezas materiais que ajudam o ser humano a viver com mais comodidade, o trabalho, seja intelectual ou manual, também eleva os indivíduos espiritualmente.
Como no mundo civilizado a troca define o relacionamento material entre os indivíduos, o trabalho deve ser devidamente remunerado, dentro de condições negociadas a partir de parâmetros que o próprio mercado tende a estabelecer.
Nesse sentido, a experiência internacional mostra que é um equívoco a tentativa de se intervir no mercado para valorizar o trabalho por meio de redução da jornada.
A produtividade sem dúvida tem relação com um certo número de horas trabalhadas por semana. No mundo moderno, dificilmente se repetiriam quadros semelhantes aos do início da Revolução Industrial, porque isso seria contraprodutivo.
Na França, os socialistas levaram avante a bandeira da redução da jornada de trabalho ao governo, e tal iniciativa não ampliou o número de empregos. Ao contrário, a economia se viu ameaçada por perda de competitividade, e agora a França busca como saída a flexibilização da jornada, transferindo ao mercado o papel de regulador. Mesmo na China, onde a oferta de mão-de-obra sempre foi abundante, o mercado tem funcionado, e os salários se multiplicaram por dez nos últimos quinze anos.