Título: DEMORA NA REFORMA MINISTERIAL DEIXA ESPLANADA À BEIRA DE ATAQUE DE NERVOS
Autor: Lygia Medeiros
Fonte: O Globo, 20/03/2005, O País, p. 4

Deputado ameaçado de perder mandato acompanha bastidores agoniado

BRASÍLIA. As idas e vindas da reforma ministerial têm, entre muitos interessados, um atento observador. O deputado petista Ricardo Zarattini (SP) segue há cinco meses cada boato, cada declaração. Não perde de vista um movimento sequer da fila de entrada e saída da Esplanada dos Ministérios. Inquieta-se não só com os rumos do governo petista, mas com o próprio futuro.

Zarattini é suplente da coligação paulista liderada pelo PT em 2002. E se um dos ministros eleitos por essa aliança retornar à Câmara ¿ caso de Aldo Rebelo, da Coordenação Política, ou de Ricardo Berzoini, do Trabalho ¿ ele perde a cadeira. Pode salvar seu mandato se Lula optar por uma troca: substituir Aldo, por exemplo, pelo deputado João Paulo Cunha (PT-SP).

Prova de resistência para ex e futuros ministros

A agonia de Zarattini é só um exemplo de como a lentidão do presidente para decidir afeta a rotina do poder. As mudanças na equipe são esperadas desde o fim das eleições municipais, em outubro. As últimas semanas foram prova de resistência para ex e futuros ministros.

Quem está em alta na bolsa de apostas tenta disfarçar. A senadora Roseana Sarney (PFL-MA) recorre ao bom humor quando é citada ao mesmo tempo para Comunicações, Integração Nacional, Cidades, Planejamento e Coordenação Política:

¿ Estou me sentindo muito competente.

Romero Jucá (PMDB-RR), o provável novo ministro da Previdência, adotou a resposta padrão ¿este é um assunto do presidente¿, e mergulhou em temas áridos. Analisa a medida provisória 232, que corrige a tabela do Imposto de Renda e eleva a carga tributária dos prestadores de serviços. E participa dos acordos para retomar a reforma tributária. Mas, estudioso, tem na ponta da língua os números da Previdência, área em que deverá trabalhar. Afinal, Lula avisou ao PMDB que espera dele nada menos que uma revolução.

¿Se o presidente ligar, passe telefone para o Zé Paulo¿

Em tempos de incerteza, ministros com emprego garantido preferem se precaver. No último dia 10, Márcio Thomaz Bastos, da Justiça, embarcou para Madri, onde participaria de solenidades que lembraram o ataque terrorista de 11 de março de 2004. Antes, instruiu o chefe de gabinete, Cláudio Alencar:

¿ Você sabe como é perigoso viajar à Península Ibérica nessas épocas. Se o presidente ligar, passe o telefone para o Zé Paulo (José Paulo Teles Barreto, secretário executivo e ministro interino). Aí, o presidente demite ele, e não eu ¿ brincou Bastos, lembrando do episódio em que o colega Cristovam Buarque foi demitido por telefone em Portugal.

O deputado Ciro Nogueira (PP-PI), indicado para as Comunicações, mostra serviço. Foi um dos cinco do PP que seguiram o governo na votação que beneficiava viúvas na reforma da Previdência. Seu cabo eleitoral, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), levou-o pelo braço para a festa de aniversário do ministro José Dirceu, na última quarta-feira. Na volta, Severino explicou:

¿ Eles são colegas, ora..

Há dias o ministro Aldo dá como certa sua demissão. Numa festa, cumprimentou Jucá usando a saudação dos romanos ao imperador antes de entrar na arena:

¿ Ave, Romero! Os que vão morrer te saúdam!

E em encontro com o líder José Múcio (PTB-PE), elogiou o terno do colega, que agradeceu. Aldo não perdeu a chance:

¿ E não foi só o que pude oferecer?

Até a oposição tenta ajudar o presidente nas difíceis escolhas. O senador José Jorge (PFL-PE) montou uma enquete na internet perguntando qual dos 36 ministros deve sair. Até o fim da tarde de sexta-feira, 122.394 votos foram computados. E mais votado foi o ministro Dirceu, com 9%, seguido pelos ministros Amir Lando (Previdência) e Tarso Genro (Educação).

¿ Dirceu é um dos mais conhecidos. E como os jornais estão dizendo que Amir Lando está demitido, as pessoas votaram nele, porque gostam de acertar ¿ explica José Jorge. ¿ Que sirva de impulso para que o presidente Lula saia desse estado de hesitação.