Título: TENSÃO PRÉ-REFORMA: CLIMA DE INCERTEZA CONTAMINA ATÉ DISCUSSÕES DE ÁREAS QUE NÃO SERÃO AFETADAS DIRETAMENTE
Autor: Cristiane Jungblut e Luiza Damé
Fonte: O Globo, 22/03/2005, O País, p. 8

Atraso na reforma já causa paralisia no governo

Planalto adia envio de projetos ao Legislativo e evita anunciar medidas que dependam de aprovação de parlamentares

BRASÍLIA. A demora do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para concretizar a reforma ministerial, a ineficiência dos líderes governistas e a desorganização da base aliada no Congresso vêm causando paralisia política no governo. O temor de novas derrotas nas votações no Congresso está levando o governo a adiar o envio ao Legislativo, e até mesmo o anúncio, de medidas que dependem de aprovação dos parlamentares. Entre elas o projeto que disciplina o marco regulatório do setor de saneamento. A tão aguardada Lei da Biossegurança, aprovada há quase duas semanas pelo Congresso, ainda não foi sancionada por Lula. O prazo vence nesta quinta-feira.

O clima de incerteza, segundo um ministro, contamina até as discussões de áreas que não deverão ser afetadas diretamente. Ontem, o próprio Lula disse ao presidente nacional do PMDB, Michel Temer (SP), que está preocupado com a falta de unidade da base.

¿ O presidente tem algumas observações em relação a projetos que agora foram aprovados e há preocupação com a falta de unidade em torno das votações. O que ele quer é garantir a governabilidade, a aprovação de projetos conseqüentes na Câmara ¿ disse Temer.

Indefinição na Previdência dificulta combate a fraudes

O chamado ¿pacote da Previdência¿ é um exemplo da paralisia que tomou conta do governo. As medidas, principalmente de combate a fraudes, vêm sendo discutidas pelos ministérios da Previdência, Fazenda, Casa Civil e Planejamento e estão com seu anúncio em suspenso por causa de dois fatores: a troca do ministro Amir Lando(PMDB-RO) pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR) no comando da pasta e o medo de que as propostas que dependem de votação do Congresso não sejam aprovadas.

Segundo um integrante do governo, o anúncio deveria acontecer esta semana, mas deverá ser adiado por causa das negociações da reforma ministerial.

Outro projeto que está em banho-maria na Casa Civil é o que cria um super Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) dentro de um novo Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC).

¿ Depois da derrota do governo no caso Severino, estamos esperando um pouco para enviar novos projetos ao Congresso ¿ disse um integrante da Casa Civil.

Além disso, Lula tem usado o prazo máximo legal para sancionar leis que foram aprovadas depois de muita polêmica no Congresso. É que qualquer veto ao texto das leis precisa ser analisado novamente por deputados e senadores. Lula esperou até o último minuto para sancionar a Lei de Falências, que tinha um artigo que beneficiava as companhias aéreas, e agora espera até o dia 24 para sancionar da Lei da Biossegurança, que trata de transgênicos.

Decisões sobre liberação de mais recursos para a reforma agrária ou para a área de infra-estrutura têm sido adiadas também pela futura mudança de ministros.

¿ Ninguém agüenta mais este assunto da reforma. E, no Congresso, estamos totalmente desorganizados ¿ desabafou um ministro.

Temer diz que Lula está preocupado com os gastos

Na conversa com Temer, Lula disse estar preocupado com projetos aprovados que aumentam os gastos públicos porque a idéia de seu governo é dar um choque de gestão para gastar melhor os recursos do Orçamento.

¿ O presidente naturalmente não vai interferir nas questões do Congresso, mas tem preocupação com projetos que são aprovados e que geram gastos infindáveis para o poder público ¿ disse Temer.

No caso da Previdência, as medidas em discussão incluem desde a criação de uma super Receita Federal, com a unificação das cobranças feitas pela atual Receita e pelo INSS, e a execução das dívidas com o INSS até um maior rigor na concessão de benefícios como o auxílio-doença, que teve aumento surpreendente nos últimos tempos, e problemas com os peritos. Essas medidas têm o objetivo de reduzir o déficit financeiro da área. A meta, segundo técnicos da Casa Civil que participam das discussões, é sair dos atuais R$38 bilhões para R$20 bilhões até o fim de 2006.

O governo acredita que isso será possível com o aumento da arrecadação, com cobrança de dívidas e combate às fraudes e com mais eficiência nas despesas e na concessão dos benefícios.

¿ É uma meta ambiciosa, mas factível ¿ disse o ministro interino do Planejamento, Nelson Machado.

Já a proposta do super Cade prevê a adoção de rito prévio e sumário sobre a negociação entre empresas, como fusões e incorporações. A idéia é evitar julgamentos arrastados.