Título: ANNAN PROPÕE MUDANÇA HISTÓRICA NA ONU
Autor: Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 22/03/2005, Economia, p. 33

Governo brasileiro comemora menções a ampliação do Conselho de Segurança e política de combate a fome e pobreza

BRASÍLIA e NOVA YORK. O secretário-geral da ONU, Kofi Annan, apelou ontem para que os países-membros da ONU aprovem suas propostas de reforma da entidade anunciadas no fim de semana, que significariam as mais profundas mudanças na estrutura da organização desde sua criação, em 1945.

Annan exortou os países a aprovarem todas as sugestões.

¿ A tentação é tratar a lista de propostas com um cardápio a la carte e selecionar aquelas de que vocês gostem especialmente. Neste caso, essa atitude não funcionará.

Entre as alterações mais drásticas, está a total remodelação da estrutura de direitos humanos da entidade; uma reestruturação do Conselho de Segurança; uma definição internacional sobre o que é terrorismo; uma reavaliação da soberania de Estados que provocam tragédias contra sua própria população; e a criação de regras claras para o uso da força.

As duas primeiras propostas foram as que mais provocaram reações ontem. A Comissão de Direitos Humanos há tempos é criticada por ter como integrantes países acusados de violações contra suas populações, como Sudão, Nepal e Cuba.

¿ Os governos entram na comissão ou para protegerem a si mesmos ou para assegurar que determinados países serão julgados ¿ disse Annan.

Anistia Internacional elogia mudança em comissão

Atualmente, os 53 membros da comissão são indicados por blocos regionais. Segundo fontes, a nova comissão terá poucos países que serão eleitos pela Assembléia-Geral por dois terços dos votos. Entidades como a Anistia Internacional e a Human Rights Watch elogiaram a proposta do secretário-geral.

Sobre a mudança do Conselho de Segurança houve reações mais variadas. O governo americano demonstrou ceticismo. Já o Brasil e os outros integrantes do G-4 (Alemanha, África do Sul e Índia), grupo de países que se candidataram oficialmente a uma vaga no conselho, comemoraram.

O governo brasileiro, um dos países mais elogiados pelo relatório, festejou duplamente. Em primeiro lugar, porque Annan defende que os países em desenvolvimento tenham espaço maior no Conselho de Segurança da ONU, o que facilitaria um possível ingresso do Brasil como membro permanente.

Outra razão é que o projeto faz uma referência ao plano de combate à fome e à pobreza, bandeira levantada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que conta o apoio de Alemanha, França, Chile e Espanha.

¿ Para nós, o relatório do secretário-geral foi extremamente positivo e cobre três esferas de nosso interesse, que são segurança, desenvolvimento e direitos humanos ¿ disse por telefone, de Nova York, o embaixador brasileiro junto às Nações Unidas, Ronaldo Sardenberg.

O que mais chamou a atenção do governo brasileiro foi a possibilidade de ampliação do número de membros permanentes do Conselho de Segurança.

Reconhecendo que é difícil um acordo entre os 191 países da ONU, Sardenberg disse que, mesmo que não haja consenso, a decisão de votar precisa ser tomada o quanto antes. Estão em discussão duas propostas. A primeira, apoiada pelo Brasil, consiste na ampliação do Conselho de Segurança de 15 para 24 membros, com seis novos membros permanentes, um deles do continente americano.

A outra proposta prevê que, além dos cinco membros permanentes atuais e 11 rotativos, seria criado um grupo de oito países semi-permanentes, eleitos para mandatos de quatro anos renováveis.

Entusiasmados com o resultado, Sardenberg e sua equipe fizeram contas para saber o número de vezes em que Annan se referiu a alguns temas. O assunto direitos humanos foi citado 90 vezes, terrorismo 60 e desenvolvimento 200.

Além do reconhecimento do plano de combate à fome e redução da pobreza, Sardenberg ressaltou que o relatório fala do papel de Brasil, Índia e China como agentes impulsionadores de outros países em desenvolvimento. Trata-se do reconhecimento da integração Sul-Sul.