Título: FORTE AJUSTE NÃO CONTEVE DÉBITOS DOS ESTADOS
Autor: Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 21/03/2005, Economia, p. 17

Governos registraram aumento de dívida de 21% em quatro anos. Causa estaria no indexador usado, o IGP-DI

BRASÍLIA. O duro ajuste nas contas públicas imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) foi seguido à risca pela maioria dos estados brasileiros, mas ainda assim o estoque de suas dívidas aumentou desde que a lei foi implementada. É o que mostram dois estudos sobre as finanças estaduais desde 2000, apresentados na última reunião dos secretários estaduais de Planejamento, em Florianópolis (SC), na semana passada.

O estudo do economista José Roberto Afonso, um dos pais da LRF, destaca o tamanho do ajuste realizado pelos estados para se adequar à lei e reduzir suas dívidas. A receita corrente líquida ¿ arrecadação de tributos e transferências da União, descontados os repasses aos municípios ¿ teve um crescimento de 13%, passando dos R$127,8 bilhões registrados em 2000 para R$144,7 bilhões em 2004.

Governadores querem que o IPCA passe a ser usado como indexador

As despesas com pessoal, por outro lado, caíram de R$62,8 bilhões para R$61,1 bilhões, o equivalente a 3% de redução. E o resultado primário, que é a diferença entre as receitas e as despesas, pulou de R$4 bilhões para R$15 bilhões no mesmo período, em uma alta de 273%.

Mesmo com esse ajuste, o estoque da dívida líquida, turbinado pela correção com base no Índice Geral de Preços (IGP-DI), mais juros, passou de R$ 229,2 bilhões em 2000 para R$278,2 bilhões no ano passado, um aumento de 21%.

Em relação à receita corrente líquida ¿ que é o conceito usado na LRF ¿ a dívida consolidada, na média, também subiu, passando de 179% para 192% da receita. A lei estabelece que a dívida dos estados não pode ultrapassar o limite de 200% da receita. Seis estados estão acima desse limite.

O estudo de Afonso foi feito com base em informações do Tesouro Nacional e se baseia em uma amostra com os 17 estados que enviaram as informações referentes a 2004. O levantamento mostra que apenas um estado está com as despesas de pessoal acima do limite estabelecido pela LRF, de 49% da receita corrente líquida. Revela também que o aumento do resultado primário verificou-se em todos os pesquisados.

Afonso atribui a elevação da dívida dos estados principalmente ao uso do IGP-DI como indexador. No período, o IGP ¿ muito influenciado por preços no atacado e choques eventuais, como desvalorizações do real ¿ ficou bem acima da variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é a taxa usada no sistema de metas de inflação.

Os governadores pressionam o governo federal para rever os termos da renegociação de suas dívidas com a União e uma das principais reivindicações é a troca do IGP-DI pelo IPCA como indexador, mas o Tesouro Nacional resiste.

¿ Nesse esforço para preservar o indexador (IGP-DI), o governo acabará enterrando a própria Lei de Responsabilidade Fiscal. Os estados não têm mais estímulo para fazer ajuste fiscal ¿ afirma Afonso.

Um outro estudo apresentado na reunião dos secretários de Planejamento pelo representante da Bahia, Armando Avena, mostra que, de 2001 a 2004, a dívida dos estados aumentou R$54,3 bilhões só por conta do descolamento do IGP-DI dos demais índices de preços. Em 2002, sua variação chegou a 26,4%, enquanto a inflação pelo IPCA foi de 12,5%.

Parte do bolo que é dividida caiu de 65% para 40% em 14 anos

O secretário também chama a atenção para as perdas dos estados nos últimos anos decorrentes da Lei Kandir e do Fundef e alerta para o risco de crise fiscal e federativa:

¿ Nunca a carga tributária cresceu tanto, mas todo esse aumento está correndo por fora da distribuição aos estados.

O estudo de Avena mostra que em 90 os tributos divididos entre União, estados e municípios correspondiam a 65,9% do bolo total. Em 2004, 14 anos depois, baixou a 40,7%.