Título: UM EXEMPLO DE GESTÃO ENVOLTO EM POLÊMICA
Autor: Cristiane Jungblut e Luiza Damé
Fonte: O Globo, 24/03/2005, O País, p. 3

Em dois anos, Costa esteve às voltas com escândalos de corrupção e falhas administrativas

BRASÍLIA. Citado ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva como exemplo de boa gestão, o Ministério da Saúde, sob o comando do petista Humberto Costa, conviveu nos últimos dois anos com escândalos de corrupção, uso político da máquina e falhas administrativas que resultaram em problemas como a falta de remédios. Em maio de 2004, o ministro viu ser preso pela Polícia Federal um assessor de sua inteira confiança, o coordenador de recursos logísticos, Luiz Cláudio Gomes da Silva, responsável pelo setor de compras do ministério.

Gomes da Silva foi detido na esteira da Operação Vampiro, que desbaratou uma rede de lobistas e servidores que superfaturavam compras de hemoderivados no ministério. Antes disso, a gestão de Costa já havia sido sacudida por denúncias de nomeações políticas no Instituto Nacional do Câncer (Inca), no Rio, em 2003, até então um centro de referência. Diretores do Inca demitiram-se denunciando indicações partidárias e falta de remédios. A crise levou o então presidente da entidade, o ex-ministro da Saúde Jamil Haddad, a deixar o cargo.

Alvo freqüente de ataques de integrantes de sua equipe, o ministro foi duramente criticado em novembro passado pelo então secretário-executivo Gastão Wagner, nada menos do que o número dois da pasta. Ele acusou Costa de orientar as ações do ministério sempre de olho no marketing e em resultados eleitorais. Citou como exemplo a ênfase no programa Farmácia Popular, que vende remédios mais baratos.

Promessa de campanha de Lula, o Farmácia Popular deveria ter sido lançado em 2003, mas só saiu do papel no ano seguinte. A meta era abrir cem farmácias em 2004, mas somente 38 foram criadas.

No mês passado, foi a vez de o então secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do ministério, Luiz Carlos Bueno de Lima, abrir fogo contra o ministro. Lima, nomeado para o cargo na cota do PP, acusou Costa de desconsiderar alertas contra a falta de matéria-prima para a produção de remédios contra a Aids, o que resultou na falta de antiretrovirais para milhares de pacientes. O secretário acabou demitido por Costa.

Por tudo isso, a demissão do petista era dada como certa na reforma ministerial que acabou não acontecendo. Enquanto era fritado e o presidente não se decidia, porém, Costa começou a aparecer na mídia com mais freqüência. Não apenas pela intervenção na saúde no Rio de Janeiro ¿ onde esteve à frente da batalha contra o prefeito Cesar Maia ¿ como pelo lançamento de programas. Em poucos dias, em meio às tensas negociações da reforma ministerial, chegou até a ameaçar quebrar a patente de remédios usados por pacientes com Aids.

Esta semana, em um único dia, inaugurou sete farmácias populares em capitais do Nordeste. Beneficiado talvez pelo fator Severino Cavalcanti (PP-PE) ¿ o presidente da Câmara ameaçou o presidente Lula dizendo que ou seu indicado assumia o Ministério das Comunicações ou o PP iria para a oposição ¿ Costa acabou ficando na Saúde. Assessores do presidente e integrantes do PT, porém, não escondiam o descontentamento do governo com sua administração à frente da pasta. Ontem, virou exemplo de gestão.