Título: ALTA DE JUROS DO BC AFETA CONSUMIDOR E TAXA SOBE A 45,7%
Autor: Geralda Doca
Fonte: O Globo, 24/03/2005, Economia, p. 19

Bancos e financeiras têm maiores altas. Economistas criticam política econômica por facilitar acesso ao crédito

BRASÍLIA e RIO. Os sete aumentos consecutivos da taxa básica Selic ¿ iniciados em setembro de 2004 ¿ começam a ter reflexos sobre os juros cobrados do consumidor e das empresas, que registram os mais elevados patamares em um ano e três meses, em alguns casos. Dados de fevereiro do relatório do Banco Central (BC) sobre juros e spreads (diferença entre o custo de captação dos bancos e o que eles cobram dos clientes) mostram que as altas foram generalizadas: desde o crédito direto ao consumidor até o capital de giro, com exceção do financiamento de veículos. Na média, os juros cobrados pelos bancos subiram de 46,8% ao ano em janeiro para 47,5% no mês passado.

Empréstimos se expandem apesar do arrocho do BC

A maior puxada dos juros foi sentida pelos consumidores que pegam recursos nos bancos e financeiras. A subida só não foi mais forte devido ao crescimento do volume de crédito consignado, que tem limite para as taxas.

Embora seja essa a intenção do BC no combate à inflação (apertar a demanda), a estratégia não está sendo bem-sucedida: a expansão do crédito continua forte, tendo subido 3,2% para as pessoas físicas e 1,9% para as pessoas jurídicas em fevereiro, em relação a janeiro. O estoque de crédito no país com recursos livres chegou a R$284,4 bilhões em fevereiro. E só nos nove primeiros dias úteis de março, o volume de operações subiu mais 1,4%, sendo a maior parte demandada por pessoas físicas.

¿ Esse problema mostra a falta de coerência da política monetária, que não consegue fazer com que as expectativas de inflação convirjam para a meta de 5,1%. É como dar com uma mão e tirar com a outra ¿ disse o economista da GRC Visão, Alex Agostini.

Ele argumenta que ao mesmo tempo em que o BC eleva a taxa de juros e encarece o crédito, as pessoas continuam indo às compras, usando o limite do cheque especial ou fazendo novos empréstimos. Para o diretor do Modal Asset, Alexandre Póvoa, existe uma contradição entre a política monetária e as medidas tomadas pelo governo para facilitar o acesso ao crédito, como o empréstimo com desconto em folha e o aumento dos recursos direcionados.

¿ Com isso, a política monetária via aumento da taxa básica de juros (a Selic) perde força ¿ disse Póvoa, acrescentando que o combate à inflação também poderia ser feito por meio de ajuste fiscal.

De acordo com o relatório divulgado ontem pelo Banco Central, os juros para empresas subiram de 32,2% para 32,4%. Esta é a taxa mais alta desde outubro de 2003, quando estava em 32,5%. Para as pessoas físicas, a taxa passou de 63,4% em janeiro para 64% em fevereiro, a mais elevada desde fevereiro do ano passado (64,2%).

Só a taxa do cheque especial passou de 144,6% em janeiro para 146,4% ao ano no mês passado, a maior dos últimos 15 meses. O custo do empréstimo pessoal também subiu, de 74,5% em janeiro para 75,3% em fevereiro, e atingiu o maior percentual desde março do ano passado.

Crédito com desconto em folha sobe para R$13,5 bi

O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, reconhece que o aumento dos juros reflete a elevação da taxa básica Selic, mas diz que o crédito com desconto em folha está segurando o ímpeto das altas. Em fevereiro, essa modalidade atingiu R$13,5 bilhões, um crescimento de 6,1% em relação a janeiro. Os juros do crédito consignado são de 39,4% ao ano, quase a metade dos 75,3% do crédito pessoal.

O encarecimento das taxas de juros em geral fez a psicóloga Marina Martins Gonçalves Bastos não utilizar os limites de crédito dados nas suas duas contas especiais, do Itaú e do Bradesco:

¿ Não uso de jeito nenhum exatamente porque os juros cobrados no cheque especial são abusivos. Se não for despesa emergencial, prefiro adiar a compra¿ disse.

COLABOROU Vagner Ricardo