Título: ALÍVIO E DECEPÇÃO MARCAM REFORMA QUE NÃO HOUVE
Autor: Lydia Medeiros, Isabel Braga e Adriana Vasconcelos
Fonte: O Globo, 27/03/2005, O País, p. 11

Ex-quase ministros e ex-quase demitidos se esforçam para não passar recibo da tensão enfrentada antes das mudanças

BRASÍLIA. Meses de expectativa e tensão pareceram evaporar instantaneamente da vida de ministros que quase perderam o cargo e de parlamentares que já eram cumprimentados pelo novo cargo e que por pouco não chegaram à Esplanada. Eles se esforçaram para absorver rapidamente o desfecho da anunciada reforma ministerial, radicalmente restrita pelas declarações desastradas e exigências descabidas do presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE). Alguns ficaram aliviados. Outros perderam expectativa de poder. Em ambos os lados, no entanto, ninguém passa recibo.

Sarney sequer deixou Lula se desculpar

A senadora Roseana Sarney (PFL-MA) foi cotada para meia dúzia de funções no primeiro escalão. Terminou sem nada, numa desnecessária exposição. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva telefonou à senadora e, segundo testemunhas, a conversa foi suave. O senador e ex-presidente da República José Sarney (PMDB-AP) pode ter guardado as mágoas de pai na geladeira, mas não chegou a deixar que Lula sequer se desculpasse:

¿ Presidente, nem vamos falar do assunto, porque não havia outra decisão a tomar.

Por meses, a demissão do ministro da Saúde, Humberto Costa, era dada como certa ¿ até por ele. Nas últimas semanas, Costa tentou firmar a imagem de bom administrador, com a intervenção nos hospitais do Rio. Não apenas ficou no cargo, como recebeu elogios pelo modelo de eficiência e gestão criticados até 15 dias atrás. Costa em momento algum acusou o golpe:

¿ Senti minha responsabilidade redobrar com a manifestação do presidente. Vou continuar a trabalhar com a mesma seriedade ¿ prometeu.

Um dos mais evidentes personagens dessa inútil negociação foi o deputado Ciro Nogueira (PP-PI). Apresentado como ministro, desfilava de braços dados com Severino, seu padrinho politico. Com o desfecho da reforma, recolheu-se. Quando a bancada do PP confirmou sua indicação, após o convite do chefe da Casa Civil, José Dirceu, Nogueira mostrou a intimidade que guardava com a prometida pasta das Comunicações:

¿ Sou um amante delas (das comunicações) ¿ resumiu.

Dirceu ignora seqüelas e marca reunião

Apesar do fracasso de todas as articulações que conduziu, Dirceu é outro que não assume a derrota. No dia da posse dos novos ministros, Romero Jucá (Previdência) e Paulo Bernardo (Planejamento), ele preferiu ignorar as seqüelas e marcar uma reunião, providência típica da cartilha petista:

¿ Não vejo por que os ministros ficariam enfraquecidos. Vamos nos reunir e continuar fazendo o que estamos fazendo.

O deputado João Paulo Cunha (PT-SP) pressionou o quanto pôde para ser coordenador político, no lugar de Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Não conseguiu. E Lula ainda culpou-o indiretamente pela derrota do PT para Severino. Aos amigos, no entanto, ele diz que não está chateado.

Lembrado para o Planejamento, o deputado Jorge Bittar (PT-RJ) mostrava-se tranqüilo na turbulenta semana que passou:

¿ Fico feliz por ter sido cogitado para uma missão tão importante ¿ disse ele.