Título: Fundos cambiais saem do calvário e voltam a dar ganhos a curto prazo
Autor: Vagner Ricardo
Fonte: O Globo, 28/03/2005, Economia, p. 20

Rendimento beira 4% no mês, puxado por leilões do BC e incertezas externas

Depois do sorriso amarelo exibido diante da rentabilidade negativa da aplicação financeira nos últimos dois anos, os investidores de fundos cambiais voltaram a respirar aliviados. Tudo porque o ganho do investimento que acompanha a variação do dólar está de novo no terreno positivo. No acumulado do mês até o dia 22, a rentabilidade dos fundos cambiais é de 3,90%. Ou seja, três vezes mais que a do Certificado de Depósito Interbancário (CDI, de 1,10%), que indica para os investidores o custo do dinheiro no mercado.

Quanto à Bolsa de Valores de São Paulo, com perda de 5,41% no mês no seu principal índice (Ibovespa), não há o que comentar. Os fundos cambiais só estão abaixo do avanço do próprio dólar comercial , com alta de 4,28% no mês, de acordo com dados do site Fortuna.

A diferença de rentabilidade deve-se às taxas cobradas pelos gestores e à composição dos títulos que formam os fundos cambiais, papéis do governo atrelados à variação da moeda americana e operações no mercado futuro.

Analistas não sabem se alta de fundos terá continuidade

Mesmo assim, não há consenso entre os analistas se a recuperação dos fundos cambiais vai persistir. A rigor, os fundos continuam a ser aplicações adequadas apenas para os investidores que buscam proteger-se dos sustos da variação cambial, em virtude de dívidas em dólar. Ou para quem tem propensão a fazer apostas arriscadas, em busca também de ganhos maiores.

Depois de dois anos de prejuízos seguidos do dólar, o economista Marcelo D¿Agosto, da consultoria Fortuna, lembra que pelo menos as chances de os investidores terem perdas com os fundos cambiais são menores este ano, já que não é muito comum a moeda americana permanecer na trajetória negativa por muito tempo. Em 2003, o dólar comercial caiu 18,23% (os fundos cambiais 10,29%, em média) e no ano passado a moeda americana cedeu outros 8,13%(e as aplicações em dólar 8,19%).

¿ Se não há certeza de que os fundos cambiais vão subir, pelo menos é certo que o risco de perda grande reduziu-se ¿ diz.

Para o gestor de câmbio da Mellon Global Investment, Carlos Eduardo Olinto, o ganho recente do dólar decorre de uma combinação de fatores. Entre os principais, os leilões de compra de dólar no mercado futuro pelo Banco Central e a crescente aversão dos investidores estrangeiros, medida pela venda de títulos de países emergentes e seguida de volta ao mercado de juros americano.

Já os fundamentos da economia brasileira continuam positivos, a ponto de o país continuar atraindo recursos externos, via Bolsa ou por meio dos juros altos da Selic. Isso faz o fluxo de ingresso da moeda americana ficar positivo, neutralizando uma alta potencial do dólar.

¿ É difícil prever, nesse momento, o que ocorrerá com a moeda e, em conseqüência, com os fundos cambiais ¿ diz.

Emanuel Pereira da Silva, diretor executivo da Gap Asset Management, também não está convicto de que a valorização do dólar será duradoura:

¿ Por enquanto, a alta ainda parece pontual e não deve prevalecer a médio prazo, a ponto de justificar uma exposição dos investidores em fundos cambiais. No plano externo, prevalece um cenário de incerteza, propício para algum avanço do dólar. Só que, no nosso caso, o BC fez compras agressivas de câmbio, o que puxou a cotação para mais que o esperado.

Com a alta dos juros nos EUA, dólar tende a subir

Segundo os especialistas, o quadro de incertezas com o futuro da economia americana, onde o fantasma de uma inflação mais alta pode obrigar o Fed, o banco central americano, a corrigir a taxa de juros de forma mais vigorosa para manter os preços estáveis, cria problemas para os países emergentes. A razão é que a alta dos juros americanos, tradicionalmente, reduz a exposição dos investidores estrangeiros em países emergentes, fazendo o fluxo de dólares cair. Em conseqüência, o dólar sobe nos países que passam a conviver com maior escassez da moeda americana.

Na opinião do analista da corretora Liquidez, Mário Paiva, salvo algum acidente de percurso, é muito improvável que os fundos cambiais possam ser a vedete do mercado em termos de ganhos. Ele lembra que os fundamentos da economia brasileira são positivos e acrescenta que o fluxo de ingresso de dólar ainda é forte. Estes fatores inibem uma alta fora de controle do dólar e, por extensão, uma valorização acentuada dos fundos cambiais.

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